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O intelecto é a faculdade pela qual são apreendidos o ser
em universal e a essência das coisas, isto é, aquilo que cada coisa é,
abstraídas as condições individuantes. As afirmações de Tomás quanto a
isto estão profusamente espalhadas em toda a sua obra. Eis aqui algumas:
"O homem é um ser tal
que intelige as formas
de todas as coisas sensíveis" (47);
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ora, a forma é o que dá o ser à matéria.
"Pelo que diz Aristóteles,
fica manifesto
que o objeto próprio do intelecto
é a qüididade ou a essência da coisa,
que não é algo separado da própria coisa,
como afirmava Platão,
mas algo existente nas coisas sensíveis.
O intelecto, porém,
apreende estas qüididades de um modo diverso
de como existem nas coisas sensíveis,
isto é, as apreende
sem as condições individuantes que,
nas coisas sensíveis,
a elas se acrescentam" (48).
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"A operação do intelecto conhece a essência;
nesta operação, porém,
há algo que lhe é pressuposto,
que é o ser:
de fato, a mente não pode conceber nada
se não inteligir primeiro o ser" (49).
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"Nossa inteligência conhece naturalmente o ser
e tudo aquilo que pertence ao ser enquanto tal;
e neste conhecimento se fundamenta
o conhecimento dos primeiros princípios" (50).
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Há outras operações na inteligência que derivam da operação
pela qual são apreendidas as essências: são o julgamento e o raciocínio.
O julgamento é a operação da inteligência pela qual ela
compõe ou divide apreensões prévias da inteligência em si indivisíveis,
como, por exemplo, quando julga "o livro é branco".
O raciocínio é a operação pela qual se passa de um
julgamento a outro, para atingir, através de julgamentos conhecidos, o
conhecimento de desconhecidos (51). Não nos vamos deter na análise do
julgamento e do raciocínio; nosso interesse será agora analisar melhor a
primeira das operações da inteligência, aquela que fundamenta as demais,
que é a apreensão das essências.
Já vimos nas citações precedentes que o objeto da
inteligência são as essências das coisas sensíveis. A inteligência
apreende as essências das coisas sensíveis sem as condições
individuantes que nas próprias coisas sensíveis se acrescentam a esta
essência. Ela é, portanto, uma operação que resulta de uma abstração.
Não é apenas a operação da inteligência que resulta de uma
abstração: a operação dos sentidos também resulta de uma abstração. Já
vimos que na operação dos sentidos o sentido recebe uma forma existente
no sensível sem a matéria existente no sensível; não apenas não recebe a
mesma matéria que havia no sensível, como nem sequer recebe a forma do
sensível em uma matéria que tenha disposições idênticas da matéria
sensível; o sentido recebe a forma do sensível em uma matéria que
nenhuma semelhança apresenta com a do sensível. Diz-se, portanto, que
recebe a forma do sensível sem a matéria.Ora, isto já é uma abstração,
porém não é uma abstração tão grande como a da operação da inteligência.
Os sentidos conhecem apenas as qualidades exteriores do objeto
conhecido, não a própria essência; ademais, quando conhecem estas
qualidades, as conhecem ainda individualizadas no objeto conhecido, isto
é, vêem esta flor amarela, aquele livro verde. Não assim a inteligência;
quando a inteligência alcança o que é um ser humano, a essência do ser
humano, já não considera mais se se trata deste ou daquele indivíduo.
Ora, toda abstração se faz a partir de um objeto do qual se
considera uma parte abstraindo-se outra. No caso dos sentidos, este
objeto é a própria coisa exterior. No caso da inteligência, o objeto
sobre o qual se trabalha para abstrair a essência é o material fornecido
pela fantasia:
"Os fantasmas, de fato,
se acham para com o intelecto
assim como as cores para a visão.
Ora, as cores se acham
para com a visão
como objetos;
portanto, os fantasmas se acharão
para com o intelecto
como objeto" (52).
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Assim como a cor e o som são objetos
materiais, a fantasia também é um objeto material; a diferença está em
que enquanto a cor e o som são externos ao animal, a fantasia é interna.
A inteligência, pois, é uma faculdade cujo objeto não é externo no
homem, mas interno; embora, através deste, relacione-se com os objetos
externos.
A operação dos sentidos, conforme vimos, resultava de uma
certa abstração sobre o sensível; a operação do intelecto, tendo por
objeto este produto da operação do sentido,
resultará em uma abstração ainda maior.
O sentido, conforme vimos, recebe a forma existente no
sensível sem a matéria do sensível nem em uma matéria de disposição
semelhante ao sensível, mas em uma matéria de disposição bastante
diversa.
Na operação do intelecto, porém, conforme veremos, pode-se
mostrar que recebe-se uma forma contida no material apresentado pela
fantasia sem, porém, disposição material alguma. Nas próximas linhas
tentaremos justificar esta afirmação; daremos uma explicação que não se
encontra nos textos de Tomás de Aquino, mas que é o que se depreende das
páginas onde ele trata deste assunto.
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