SERMO VIII

Sobre a festa de qualquer santo.




Caríssimos, a Escritura afirma que

"Israel germinará como o lírio".

Os. 14, 6

É por isso que cantamos:

"O justo germinará como o lírio,
e florescerá eternamente diante do Senhor".

Se houver quem as busque, nas coisas visíveis podem ser encontradas tantas significações de coisas espirituais e invisíveis quantas forem as propriedades das coisas visíveis e corporais, seja interiormente em sua natureza, seja exteriormente em sua forma. Isto significa, portanto, que não apenas as próprias coisas, mas também as suas qualidades e disposições formais existem para o conhecimento e a busca das diretivas e das exortações do sumo e eterno bem. O homem a quem o Senhor ensina a ciência é chamado ao bem verdadeiro e imutável não apenas interiormente pela razão e pelo desejo, mas também exteriormente pela Escritura e pela criatura.

A primeira propriedade do lírio que surge diante de nossos sentidos é o seu verdor. Observamos também que o lírio cresce para o alto, sem inclinar-se para um lado ou para outro. É planta medicinal, possuindo em sua raiz fibras muito apropriadas para este uso. Seu caule é revestido pelas suas folhas. Quando alcança a plenitude de seu crescimento, encontramo-lo orientado para o alto também pelos seus vários ramos. Possui uma flor branca fendida em seis partes, no interior da qual encontramos uma suave fragrância e a cor do açafrão pelos seus grãos. O lírio, ademais, não só cresce para o alto, como também é reto em sua estatura.

Todas estas coisas convém espiritualmente ao homem justo. O homem justo possui o seu verdor e cresce em direção ao alto, e todas as demais coisas que encontramos no lírio nele também se encontram espiritualmente.

O verdor designa a fé porque, conforme já mostramos em outro sermão, assim como o verdor é a primeira coisa encontrada no que germina, assim também a fé é a primeira de todas as virtudes.

O crescimento para o alto significa a esperança, pela qual nos erguemos do mundo presente ao consórcio dos espíritos superiores, à plenitude da verdadeira bem aventurança, à esperança, ao amor, ao desejo, à busca e ao encontro da contemplação do Deus eterno.

Assim como o lírio, o homem justo também é medicinal pelo seu ensino. As doenças e as enfermidades do corpo curam-se com diversos antídotos e medicamentos; do mesmo modo, as doenças da alma são curadas de muitas maneiras pelo ensino. Assim como os fármacos e os medicamentos curam os abcessos, assim também, quando ensinamos, as palavras expelem o pecado.

O justo possui fibras e raízes interiormente unidas, pois nele o pensamento concorda com o pensamento, o sentido concorda com o sentido, a vontade concorda com a vontade, o afeto concorda com o afeto. O justo concorda de tal modo consigo mesmo que não muda de uma para outra coisa, conforme está escrito, bem diversamente, do insensato. A Escritura, de fato, afirma que

"o insensato muda como a Lua",

Ecl. 37, 12

pois assim como a Lua ora é nova, ora é minguante, ora é cheia, mudando sem cessar de um estado para outro, assim também o insensato, dominado pelos desejos carnais, muda de tal modo que nunca concorda nem consigo mesmo nem com outrem, estando sempre em discordância.

Deve-se notar que as folhas do lírio crescem para o alto. Assim também tudo o que o justo faz exteriormente pela ação é elevado para o alto pela intenção. Reto, pela justiça tributa a cada um o que é seu; ao fiel tributa o que é do fiel, ao infiel tributa o que é do infiel, ao justo tributa o que é do justo, ao injusto tributa o que é do injusto, ao amigo o que deve ao amigo, ao inimigo o que deve ao inimigo,

"a César o que é de César,
a Deus o que é de Deus".

Mat. 22, 21

O justo, ademais, divide-se em muitos ramos pela multiforme graça do Espírito Santo. Inundado pelos seus diversos dons, não é inconvenientemente dito dividido em diversos ramos.

O justo é branco pela pureza. Livre de toda mácula da mente e do espírito, imita a brancura do lírio pelo decoro da pureza, fendido em seis partes pela perfeição. O número senário, pelo que consta, significa a perfeição, e o justo aperfeiçoa-se pelas suas partes. As partes do senário são o um, o dois e o três, que simultaneamente constituem seis, e quer se diga seis vezes um, três vezes dois ou duas vezes três, consuma-se o mesmo número senário.

Os grãos, situados na flor, estendidos e da cor do açafrão, são figura da caridade. Conforme já demonstramos em outro lugar, a cor do açafrão parece imitar o rútilo esplendor da chama. Conforme também dissemos em outros sermões, a fragrância do lírio designa a boa fama.

O lírio possui ainda outras propriedades, como a sua natureza frígida, que sugere a extinção dos vícios, e outras mais que podem figurar as virtudes e as boas obras. Por ora, porém, seja suficiente termos tratado das que já falamos.

Devem-se notar também as quatro palavras que foram ditas:

"germinará,
florescerá,
eternamente,
diante do Senhor".

No lírio, irmãos, primeiro vem o germinar, no fim o florescer. O germinar designa, portanto, o bom início; o florescer, a consumação. A palavra "eternamente" designa a perpétua perseverança do justo no bem, e a expressão "diante do Senhor" refere-se à sua boa intenção. O justo, portanto, germina, iniciando coisas boas; floresce, consumando-as; eternamente, perseverando; e diante do Senhor, realizando seus bens pela reta intenção.

Apliquemo-nos, irmãos, portanto, pelos méritos e pela intercessão do justo cuja solenidade hoje celebramos, a germinar e a florescer deste modo, para que mereçamos ser admitidos na glória do reino celeste, para tanto auxiliando- nos Jesus Cristo, nosso Senhor, que vive e reina pelos séculos dos séculos.

Amén.