SERMO VII

Sobre a festa dos Apóstolos.




"Quem são estes
que voam como nuvens,
e como pombas nas janelas?"

Is. 60, 8

Caríssimos, hoje celebramos a solenidade dos bem aventurados apóstolos. O profeta, admirado pela sua dignidade e excelência, proclamou, divinamente inspirado, este oráculo em sua recomendação, louvor e admiração:

"Quem são estes
que voam como nuvens,
e como pombas nas janelas?"

Movidos por uma pronta devoção, passaremos a expor, na medida em que Deus, o Senhor das ciências, no-lo conceder, as palavras deste oráculo, tão brilhantes e tão divinas. Sejam estas não apenas para a honra e louvor daqueles de quem foram ditas, como também para a vossa utilidade, para quem foram ditas e por quem ansiamos, na esperança, pela sua consumação.

"Quem são estes",

diz o profeta,

"que voam como nuvens?"

Bela e convenientemente, irmãos caríssimos, os santos apóstolos são comparados e significados pelas nuvens. Sabemos não apenas pelos nossos sentidos, como também pelas palavras dos santos, que as nuvens possuem quatro propriedades, as quais designam as quatro principais virtudes dos bem aventurados apóstolos. As nuvens fazem chover, protegem, relampejam e voam; assim também os apóstolos fazem chover, protegem, relampejam e voam.

Os apóstolos fizeram chover quando

"o seu som estendeu-se por toda a terra,
e as suas palavras
até as extremidades do mundo".

Salmo 18, 5

Fizeram chover pelo ensino, protegeram pela intercessão, relampejaram pelos milagres, voaram pela contemplação.

Cada um deles fêz chover onde ensinou. Tomé fêz chover na Índia maior, Bartolomeu na Índia menor, Simão e Judas na Pérsia, Filipe na Scítia, Mateus na Etiópia, Marcos em Alexandria, João na Ásia, André na Acaia, Pedro na Capadócia, Paulo na Grécia, Pedro e Paulo, finalmente, na Itália. Foi assim que, no princípio da graça, pelo muito soar de seu ensino, derramaram a chuva das palavras da salvação. Esta era a chuva a que o salmista se referia quando exclamava:

"Minha alma tem sede de ti,
ó Senhor,
como terra sequiosa".

Salmo 142, 6

A terra, isto é, o gênero humano, voltado para as coisas terrenas, recebeu sobre si esta forte chuva a qual produziu o seu fruto, fruto do qual está escrito:

"Levantai vossos olhos
e vêde os campos já branquejando
para a ceifa;
aquele que sega
junta frutos de vida eterna".

Jo. 4, 36

Quão grande é a excelência destas nuvens para que a sua chuva forte tanto inebrie a terra que a faça produzir tais frutos! Ainda hoje, para a nossa salvação, todas as vezes que lemos ou meditamos em seus escritos, somos irrigados pelas gotas desta chuva.

Os apóstolos protegem pela intercessão todas as vezes que se colocam entre nós e Deus, para que Deus em sua ira não veja nossos crimes e nos puna pelo fervor com um julgamento rigoroso. Quando dava graças e orava sem cessar pelos que havia convertido, Paulo era nuvem, protegendo aos que lhe haviam sido confiados. Ele e outros nos protegem ainda quando, diante de Deus, derramam preces pela nossa salvação.

Os apóstolos relampejam pelos milagres, ressuscitando os mortos, purificando os leprosos, iluminando os cegos e curando outros enfermos não apenas enquanto viviam na carne, mas também agora, que reinam com Cristo.

Seu vôo significa a contemplação. Não voava, porventura, aquele que dizia:

"Nossa conversação está nos céus"?

Fil. 3, 20

Verdadeiramente voaram todos eles, quando subiram até o palácio do céu para reinarem com Cristo.

Os apóstolos, portanto, são nuvens, fazendo chover pelo ensino, protegendo pela oração, relampejando pela virtude, voando pela contemplação.

O profeta, porém, continua, dizendo que eles também são

"como pombas nas janelas".

A pomba é uma ave simples, que nem possui interiormente a ira do fel, nem exteriormente a simulação da obra. Ela significa, portanto, a verdadeira simplicidade. As janelas são os sentidos corporais, pelas quais saem as coisas interiores e entram as coisas exteriores. Os santos apóstolos, deste modo, são ditos serem como pombas nas janelas porque são reconhecidos pela simplicidade colombina que possuem.

Às palavras do salmista podemos acrescentar este outro verso, também em seu louvor:

"Eram mais brancos do que a neve,
mais claros do que o leite,
mais rubros do que o marfim antigo,
mais formosos do que a safira".

Lam. 4, 7

Pela neve, que procede do céu e é mais branca do que qualquer outra brancura, podemos entender a virgindade; pelo leite, que nasce da fecundidade da carne, os cônjuges do Novo Testamento; pelo marfim antigo, por ser o elefante um animal castíssimo, os continentes do Velho Testamento; pela safira, finalmente, por trazer a cor do céu, os homens espirituais deste mesmo Testamento.

Os santos apóstolos são mais brancos do que a neve, mais claros do que o leite, mais rubros do que o marfim antigo, mais formosos do que a safira porque sobrepujam por uma admirável dignidade as virgens do Novo Testamento, as quais imitam a vida angélica pela honestidade da castidade; porque sobrepujam também os cônjuges que convivem legitimamente e transcendem por uma singular excelência os continentes do Velho Testamento, também eles rubros pelo martírio, e seus homens espirituais, ou profetas. De fato, diz a Escritura, muitos profetas e justos do Velho Testamento

"quiseram ver o que eles viram,
e não viram,
e ouvir o que eles ouviram,
e não ouviram".

Mat. 13, 7

Isaías manifestou este desejo quando, contemplando em espírito a Cristo coberto de bofetadas, coroado de espinhos e suspenso na cruz, disse a seu respeito:

"Nós o vimos;
não tinha aparência,
e o desejamos.
Era desprezado e o último dos homens,
homem de dores
e conhecedor da fraqueza".

Is. 53, 2-3

E não apenas ele, mas também no Novo Testamento os mártires, os confessores, as virgens e todos os demais santos de boa vontade teriam visto Cristo na carne e teriam ouvido sua salutar doutrina se o tivessem podido. Este privilégio, porém, foi concedido à dignidade apostólica. Os bem aventurados apóstolos, portanto, precedem todos os santos, eles que viram Cristo na carne e receberam as primícias do Espírito Santo enviado do céu.

Procuremos, irmãos caríssimos, venerá-los por um digno louvor. Procuremos imitá-los também pelas boas obras. Roguemos para que sejamos governados pelo seu regime e patrocinados pela sua intercessão. Desejemos, finalmente, unirmo-nos ao seu consórcio e fruir de sua felicidade.

Que para tanto venha em nosso auxílio Jesus Cristo, nosso Senhor, que com o Pai e o Espírito Santo reina pelos séculos dos séculos.

Amén.