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No início da Prima Secundae da Summa Theologiae, Tomás de 
Aquino afirma que todas as ações propriamente humanas são feitas tendo 
em vista um fim. É assim que ele explica este fato: 
 
| "Nem todas as ações do homem", | 
 
 diz Tomás de Aquino,
 
 
| "são ditas humanas. Somente são ditas humanas
 aquelas que são próprias
 do homem enquanto homem.
 Ora, o homem difere das criaturas irracionais
 pelo fato de ser senhor de seus atos.
 Portanto, somente serão chamadas
 propriamente humanas aquelas ações
 das quais o homem é senhor.
 O homem, porém,
 é senhor de seus atos
 pela razão e pela vontade,
 de onde que são ditas
 ações propriamente humanas
 aquelas que procedem
 da vontade deliberada.
 
 As demais ações podem ser ditas
 ações do homem,
 mas não propriamente humanas,
 pois não são do homem enquanto homem.
 
 É manifesto, porém,
 que todas as ações
 que procedem de alguma potência,
 tal como a vontade ou a inteligência,
 são causadas por ela
 segundo a razão de seu objeto.
 O objeto, porém, da vontade,
 é o fim ou o bem.
 Portanto, todas as ações humanas
 são por causa de um fim" (2).
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| "Há muitas coisas que o homem faz sem deliberação,
 nas quais às vezes nem sequer chega a pensar,
 como quando alguém move o pé ou a mão
 ou coça a barba.
 Nestas coisas o homem não age
 por causa de um fim,
 mas também estas ações
 não são propriamente humanas,
 pois não procedem de uma deliberação da razão
 que é o princípio próprio das ações humanas;
 podem ter um fim imaginado,
 não porém conferido pela razão"  (3).
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Portanto, segundo Tomás de Aquino, em todas as ações propriamente 
humanas verifica-se a existência de um fim. 
  
 
É preciso agora investigar se existe um fim último entre os 
fins a que as ações humanas se dirigem. Tomás de Aquino responde que 
sim, que existe este fim último, e a explicação que ele dá é a seguinte: 
 
  
 
| "É impossível, porém, proceder nos fins até o infinito.
 
 Pois, de fato, em todas as coisas
 que possuem ordem por si mesmas,
 é necessário que,
 se for removida a primeira,
 sejam removidas todas as demais
 que se ordenam a esta.
 É por isto que o Filósofo diz,
 no VIIIº da Física,
 que não é possível nas causas moventes
 proceder até o infinito,
 porque neste caso já não haveria
 um primeiro movente  e,
 retirado este,
 as demais não poderiam mover-se,
 pois não se movem a não ser
 movidas pelo primeiro movente.
 
 Nos fins, porém,
 encontramos duas ordens:
 a ordem da intenção,
 e a ordem da execução.
 Em ambas estas ordens
 é necessário haver um primeiro.
 
 Aquilo que é primeiro na ordem da intenção
 é um princípio que move o apetite;
 se retirarmos este princípio,
 o apetite não poderá ser mais movido.
 
 Aquilo que é o princípio na execução,
 é aquilo por onde principia a operação;
 se retirarmos este princípio,
 nada mais operaria.
 
 Ora, o princípio da intenção
 é o fim último;
 o princípio da execução
 é a primeira das coisas
 que se ordenam àquele fim.
 De nenhuma destas partes
 é possível proceder até o infinito pois,
 se não houvesse um fim último,
 nada seria apetecido,
 nem alguma ação terminaria,
 nem repousaria a intenção do agente;
 se não houvesse um primeiro
 nas coisas que se ordenam ao fim,
 nada começaria a ser feito,
 nem haveria fim para aconselhar-se sobre o que fazer,
 mas nisto tudo se procederia até o infinito" (4).
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Portanto, diz Tomás de Aquino, não é somente no cosmos que 
se observa uma ordem, cujo fim a que ordenam todas as coisas compete ao 
sábio investigar; um fenômeno idêntico ocorre também na psicologia 
humana; a alma humana tende, por natureza, a um fim último, e aqui, 
novamente, a investigação deste fim compete ao sábio. 
 
  
Este fim último, continua Tomás, tem que ser um só; não 
podem ser dois ou mais. Na Summa Theologiae ele afirma isto 
explicitamente: 
 
 
 
| "É impossível que a vontade de um só homem se ordene simultaneamente a diversos bens
 tomados como fins últimos" (5).
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Por que razão? Segundo o Comentário à Ética, uma primeira razão provém 
da própria unidade da natureza humana: 
 
  
 
| "É necessário que exista um único fim para o homem enquanto homem
 por causa da unidade da natureza humana,
 assim como existe um único fim
 do médico enquanto médico
 por causa da unidade da arte medicinal"  (6).
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Outra razão para que a vontade humana tenha que se ordenar a um fim 
último único é dada na Summa Theologiae: 
 
  
 
| "Como cada um apetece sua perfeição, aquilo que alguém apetece como fim último
 é o bem perfeito e completivo de si próprio.
 É necessário, portanto,
 que o fim último de tal modo
 preencha todo o apetite do homem
 que nada mais fora dele fique para ser apetecido,
 o que não poderá  verificar-se
 se  se  requeresse algo mais
 além da própria perfeição.
 Portanto, não pode ocorrer
 que o apetite tenda de tal modo a duas coisas
 que ambas fossem o bem perfeito dela" (7).
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Tudo o que os homens querem, continua S. Tomás, o querem por causa do 
fim último, pois 
 
 
 
| "o fim último está para o movimento do apetite assim como o primeiro movente está
 para os demais  movimentos.
 Ora, é manifesto que as causas segundas moventes
 não movem senão na medida
 em que são movidas pelo primeiro movente.
 De onde que os apetecíveis segundos
 não movem o apetite senão na medida
 em que se ordenam ao primeiro apetecível,
 que é o fim último"  (8).
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Encontramos, portanto, no homem, uma estrutura semelhante à 
ordem que observamos no Universo. Há um fim último na vontade do homem 
enquanto homem, algo que ele quer acima de tudo e em função do que ele 
quer todas as demais coisas. 
  
 
Ora, se isto é assim, trata-se de algo que a educação não 
pode deixar de levar em conta, não apenas para não destoar da estrutura 
do Universo, mas também para não frustrar o próprio homem. 
 
  
Resta determinar em que consiste este fim que é o anseio 
profundo da vontade humana. 
 
  
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