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As bem aventuranças mencionadas por Jesus no Sermão da
Montanha distinguem, portanto, todo o curso da vida espiritual:
"Ocorre com as bem aventuranças", |
diz S. Gregório, bispo de Nissa no sec.V,
"algo semelhante àquilo que foi ensinado
ao patriarca Jacó
por meio da visão de uma escada
que subindo da terra,
alcançava as alturas do céu,
e em cujo topo via-se a Deus.
O mesmo agora nos ensina a doutrina
das bem aventuranças,
que levanta e conduz
aqueles que por ela sobem
ao entendimento de coisas
sempre mais sublimes.
Sob as aparências de uma escada
foi mostrado ao santo patriarca
aquela vida unida com a virtude,
para que ele aprendesse,
e ensinasse aos outros,
que não pode subir até Deus
senão aquele que tenha as vistas
sempre voltadas para algo mais alto,
e não se contente com as coisas que já fez
ou em permanecer nas que já alcançou,
considerando uma perda
não buscar coisas mais altas;
a altura das bem aventuranças
umas para com as outras
faz com que aqueles
que já receberam algumas delas
possam se aproximar de Deus,
que é verdadeiramente feliz,
constituído e estabelecido
acima de toda bem aventurança" (76).
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Uma doutrina essencialmente idêntica à contida nas bem
aventuranças foi ensinada por Hugo de S. Vitor sob a forma de uma
sucessão de três dias que distinguem o curso da vida espiritual.
Ela está contida no final do VII do Didascalicon, e ressalta de
modo especial alguns dos pontos principais sobre os quais
quisemos conduzir a exposição precedente; é também fundamento
para entender o que se seguirá mais adiante:
diz Hugo de S. Vitor,
"três dias interiores
pelos quais a nossa alma se ilumina.
Três são os dias da luz invisível,
pelos quais se distingue o curso interior
da vida espiritual.
O primeiro dia é o temor,
o segundo a verdade,
o terceiro é a caridade.
O primeiro dia é o dia do temor;
vem depois o outro dia,
o dia da verdade.
E dissemos que vem,
não que o sucede,
porque o anterior não cessa;
o mesmo ocorre com o terceiro dia,
com o dia da caridade,
pois vindo este,
aos anteriores não expulsa.
Os homens compreendem,
em primeiro lugar,
terem caído sob o jugo do pecado
quando começam a temer a Deus como juiz
por reconhecerem suas iniquidades.
Temê-lo já é conhecê-lo,
porque de maneira alguma poderiam temê-lo
se dEle nada conhecessem.
Este conhecimento já é alguma luz;
já é dia,
mas não é dia claro,
escurecido que está pelas trevas do pecado.
Vem então o dia da verdade,
que ilumina a claridade do dia anterior,
e não tira o temor,
mas o muda para melhor.
Mas esta claridade
não será ainda pleno dia
até que a caridade
não se acrescente à verdade.
De fato,
foi a própria verdade que disse:
`Muito tenho ainda para vos dizer,
mas não o poderíeis compreender.
Quando vier o Espírito da verdade,
vos ensinará toda a verdade'. |
Assim,
o dia da verdade clarifica
o dia do temor;
o dia da caridade clarifica
o dia do temor e o dia da verdade;
até que a caridade se torne perfeita
e com isto toda a verdade
seja perfeitamente manifestada" (77).
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Observa-se neste texto como Hugo de S. Vitor afirma,
em primeiro lugar, que os três dias da vida interior, que
correspondem ao conjunto das sete bem aventuranças, são também de
natureza cumulativa; não se extinguem uns aos outros em sua
sucessão; ao contrário, se acumulam, o segundo aperfeiçoando o
primeiro, em vez de extingui-lo, e o terceiro aperfeiçoando os
dois primeiros, em vez de extingui-los.
Mas neste texto Hugo de S. Vitor distingue também dois
modos de conhecimento, que se seguem ao dia do temor.Ao primeiro
ele chama apenas de dia da verdade; diz, porém, que a claridade
deste dia ainda não é perfeita.
Para que a claridade seja plena, diz Hugo, a caridade
tem que se acrescentar à verdade. Isto não significa que os que
viviam no dia da verdade não fossem movidos pela caridade; ao
contrário, já os que viviam no dia do temor possuíam a caridade,
pois viviam na graça; com mais razão aqueles que vivem o dia da
verdade vivem também na caridade. Se, portanto, Hugo afirma que à
verdade deve-se acrescentar a caridade, isto significa que ele
está se referindo a uma caridade mais eminente do que as
anteriores, tão eminente que se torna a nota manifestamente
distintiva do terceiro dia, ao qual Hugo chama de dia do amor.
Somente quando a caridade se torna perfeita, continua Hugo, é que
toda a verdade é perfeitamente manifestada.
Hugo de S. Vitor, portanto, está descrevendo uma forma
mais perfeita de conhecimento que é alcançada no terceiro e
último dia da vida espiritual, a qual provém da caridade. Esta
caridade, segundo ele, provém do Espírito Santo, pois Hugo cita a
passagem de São João na qual o Cristo diz que, quando viesse o
Espírito da verdade, ensinaria toda a verdade. Este Espírito da
verdade, diz Hugo, vem no terceiro dia, o dia do amor.
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