CAPÍTULO DÉCIMO SEGUNDO

1.

Os que gostam de estudar as Escrituras encontram aqui outro problema. Se os últimos não participam em tudo o que dispõem os mais altos, por que as Escrituras chamam a nosso hierarca humano de "anjo do Senhor onipotente" (Mal. 2 ,7; Mal. 3, 1; Gal. 4, 14; Apoc. 2-3)?

2.

Creio que esta expressão não contradiz de modo algum o que foi dito anteriormente. Reconhecemos que as ordens inferiores não possuem a plenitude nem o poder completo correspondente às superiores. Porém participam proporcionalmente no poder daqueles como parte da harmoniosa, universal e eqüitativa comunhão em que todos se entrelaçam. Deste modo, mesmo no caso de que a ordem dos santos querubins possua sabedoria e ciência mais elevadas, também as ordens dos seres inferiores compartilham em menor proporção sua sabedoria e ciência, ainda que seja inferior e parcial. De fato, todos os seres inteligentes deificados participam na sabedoria e na ciência. Eles se diferenciam segundo que esta participação venha diretamente da fonte ou de modo indireto e inferior, conforme à capacidade de cada um. Isto se pode dizer de todos os seres-inteligências deificados, e assim como a primeira ordem possui em plenitude os santos atributos de suas inferiores, estes têm também os dos superiores, ainda que em menor proporção, não de igual modo.

Pelo que não vejo nenhum inconveniente em que as Escrituras chamem de "anjo" inclusive a nosso hierarca (o bispo). Possui a propriedade de ser, dentro do possível, como os anjos, um mensageiro. Têm, ademais, a missão de imitar, segundo suas possibilidades, o poder revelador dos anjos.

3.

Poderás também advertir como a Escritura chama "deuses" não apenas aos seres celestes, que estão muito acima de nós (Sl. 82, 1; 95, 3; Gen. 32, 28-30), mas também aos homens piedosos que entre nós se distinguem por seu amor a Deus (Ex. 4, 16; 7, 1; Sl. 45, 6; 82, 6; Jo. 10, 34). Deus é mistério que transcende todo ser. É supraessencial a todo ser. Nada há que de nenhum modo possa comparar-se com Ele. No entanto, todo ser dotado de inteligência e razão, que tenda com todas as suas forças à união com Deus, que procure imitá-lo incessantemente o quanto possa, tal homem bem merece que o chamemos de divino.