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Por que alguns não crêem?O tema deste livro foi a fé, como meio de se alcançar a graça do Espírito Santo. Não se pode concluir este assunto, porém, sem examinar mais cuidadosamente a questão sobre o motivo por que há pessoas que não crêem.De tudo quanto dissemos, poderia-se concluir que, se há pessoas que não crêem, o motivo é a falta de oração. De fato, se elas orassem a Deus pedindo a fé, receberiam a fé e creriam; como, porém, não oram, não crêem. Não crendo, segundo ensina Jesus, já estão condenados, porque não podem se aproximar da luz de Deus. E suas próprias obras os condenarão, pois sem a luz da graça lhes será impossível cumprir os mandamentos divinos. Se estas pessoas orassem, porém, obteriam facilmente a fé, passariam a caminhar da fé para a fé, viveriam da fé e se tornariam santos, conforme diz São Paulo em Romanos 1, 17. Parece poder concluir-se, portanto, que se as pessoas não têm fé é porque não oram. E isto, de fato, é verdade. O problema, porém, é que para a eficácia da oração requer-se, além da sinceridade, a própria fé. Não é possível, portanto, alcançar a fé através da oração se já não tivermos alguma fé. É pela fé que alcançamos, através da oração, uma fé ainda maior, sendo por isto que na Epístola aos Romanos São Paulo diz que
logo em seguida acrescentando
sentença que já tínhamos citado anteriormente mas que somente agora estamos em condições de interpretar. Pois para obter a fé, é preciso já possuí-la; para alcançar uma fé mais plena, que é fruto de uma maior plenitude de graça, é preciso obter esta graça, a qual não se obtém senão através da fé que é uma das condições da oração. Caminhando assim, da fé para a fé, chega-se àquela vivência desta virtude que faz São Paulo dizer: "o justo vive da fé". Mas se o homem não tiver fé nenhuma, não poderá alcançá-la, pois ela mesma é uma das condições colocadas para se poder obtê-la. Ademais, a fé é causada no homem pela graça: ela é, conforme vimos, a primeira manifestação da graça no homem. Deduz-se, portanto, que para o homem alcançar a fé necessita da graça. Bastaria uma simples oração para obtê-la, mas até uma coisa tão simples como esta é absolutamente impossível sem o auxílio da graça. Para que o homem creia, portanto, é preciso que ele seja inicialmente movido a tanto pela graça. Sem a graça divina, o homem não pode fazer absolutamente nada a este respeito. Não há absolutamente nada que o homem possa fazer para obter a graça sem o auxílio da própria graça. Sem este primeiro impulso da graça, sobre o qual o homem não tem controle algum, ele não pode fazer nada para salvar-se, não quererá fazê-lo e provavelmente sequer entenderá que deve fazê-lo. Há diversas passagens do Evangelho de São João onde o próprio Jesus examina pessoalmente esta problemática questão. No quinto capítulo deste Evangelho, Jesus diz aos judeus:
Nesta passagem Jesus diz aos judeus que ele entende perfeitamente que os judeus não creiam nele, pois não podem crer porque não buscam a glória que vem só de Deus. Se buscassem a glória que vem só de Deus, insinua Jesus, assim que Jesus se lhes apresentasse, eles creriam. O problema, porém, é que não é possível buscar sinceramente a glória que vem só de Deus se o homem não for movido pela graça do Espírito Santo. De onde que se deduz que, segundo Jesus, os judeus não criam nele, e não podiam crer, mesmo vendo os milagres e ouvindo a pregação de alguém da estatura de Jesus, porque não eram movidos pela graça. No capítulo seguinte do Evangelho de São João, novamente Jesus se coloca a mesma questão. Ele diz a outros judeus:
Jesus diz nesta passagem que ninguém pode vir até ele se o Pai que o enviou não o atrair. O que significa, para Jesus, a expressão "vir até ele"? No Evangelho de São João encontramos escrito:
de cujas palavras deduz-se que, para Jesus, vir até ele e crer nele são a mesma coisa. Quando Jesus diz, portanto, que ninguém poderia vir até ele sem que o Pai que o havia enviado o atraísse, queria dizer que ninguém poderia crer nele se a tanto não fosse movido pela graça divina, ainda que o tivesse conhecido pessoalmente, tivesse visto os seus milagres e ouvido os seus ensinamentos. Mais um capítulo adiante, no mesmo Evangelho de São João, encontramos novamente Jesus fazendo idênticas considerações:
diz Jesus,
Nesta outra passagem, Jesus diz que os homens reconhecerão se a sua doutrina vem ou não de Deus, isto é, crerão ou não na sua pessoa e no que Ele nos ensina, se quiserem fazer a vontade daquele que o enviou. Ora, na Primeira Epístola aos Tessalonicenses São Paulo diz:
Jesus, portanto, quis dizer na passagem acima que, se alguém está buscando verdadeiramente a santificação, reconhecerá imediatamente se o que ele ensina vem ou não de Deus, isto é, crerá nele. Segundo Jesus, portanto, qualquer pessoa que verdadeiramente esteja em busca da santificação, ao lhe serem explicados quais são os seus ensinamentos, reconhecerá imediatamente, sem sombra de dúvida, que tais ensinamentos procedem de Deus e crerá nele. Porém, novamente, não é possível alguém estar verdadeiramente em busca da santificação sem estar sendo movido pela graça. Deduzimos, assim, outra vez, que sem a graça não é possível discernir a diferença entre os ensinamentos de Jesus e outros ensinamentos humanos e, sem isto, é impossível crer nele. Podemos então dar uma resposta à pergunta sobre o motivo por que alguns crêem e outros não. Alguns crêem e outros não porque uns oram e outros não; mas até para orar e pedir a fé é necessário já possuir alguma fé e que a graça mova o homem. Tudo depende, portanto, em última instância, da graça divina. Se Deus não concede a graça, o homem nada poderá fazer e sequer o quererá fazer. Se Deus conceder a graça, a inteligência do homem se abre e sua vontade se sentirá atraída para pedí-la. Se o homem não contar, porém, com o auxílio da graça, nada poderá fazer para obtê-la. Temos nas narrativas dos Evangelhos um claro exemplo de como isto acontece na história dos dois ladrões crucificados ao lado de Jesus:
Nesta narrativa pode-se perceber nitidamente, nos dois ladrões, algo mais do que apenas a diferença entre bondade e maldade. O mérito do bom ladrão não foi apenas o de ter sido humilde e haver reconhecido as suas faltas, nem na conduta do mau ladrão observamos apenas uma manifestação de orgulho e revolta ao não querer reconhecer a diferença entre suas culpas e a inocência de Jesus. Se examinarmos o texto acima com mais cuidado, verificaremos que o bom ladrão se dirige a Jesus como a um rei, e a um rei poderoso, capaz de conceder dons preciosíssimos como o paraíso, maiores do que os que o próprio Imperador de Roma poderia conceder, o qual na época era o mais poderoso de todos os homens. Aparentemente, porém, não havia nada em Jesus que pudesse indicar estar ele revestido de tão extraordinária realeza: ele estava sendo crucificado como um simples marginal e desde que havia sido preso nenhum soldado nem nenhum súdito se havia apresentado para lutar por ele. Não havia nada, também, que pudesse indicar que houvesse nele poder algum; ao contrário, ele parecia mostrar-se impotente até para descer da cruz em que estava pregado. Não havia também nada que indicasse que ele pudesse fazer qualquer coisa por quem quer que fosse: dali a poucos instantes tudo parecia sugerir que Jesus seria um homem morto, nada mais do que um cadáver. A morte de Jesus era tão iminente que já era praticamente um fato consumado; Jesus era, do ponto de vista humano, praticamente falando, nada mais do que um cadáver de um homem inteiramente abandonado. E, no entanto, este bom ladrão estava vendo nEle algo que nenhum olho humano poderia ver: dirigiu-se a Ele, com toda a naturalidade, como se o faz a um Rei, prestes a sentar-se em um trono infinitamente mais poderoso que o do Império Romano, o mais poderoso dos tronos já aparecido na história humana até aquela época, e pediu-lhe com toda a humildade que se lembrasse dele quando assim o fizesse. Não havia nada que o bom ladrão soubesse de Jesus que o outro ladrão também não o soubesse, mas o segundo não conseguia ver em Jesus nada do que o primeiro via. O primeiro, porém, o fazia com toda a naturalidade, e confiava, contra toda a evidência dos olhos da carne, que seria ouvido por Jesus. Era a graça que movia a sua alma, elevando suas faculdades para a apreensão de uma realidade sobrenatural, tornando evidente para ele o que para o outro não passava de uma loucura. Através da graça, alcançou a fé e, conforme Jesus havia ensinado tantas vezes quando em vida, a sua fé o salvou: naquele mesmo dia ele entrou com Jesus no paraíso. Seu colega, infelizmente, inteiramente privado da luz da graça, não conseguiu perceber nada disso e, no que depende apenas do relato escrito que nos ficou, não pode ter alcançado a mesma sorte. De tudo isto, portanto, deduz-se que se alguns crêem é porque são movidos a tanto pela graça enquanto que outros não crêem porque não podem contar com o auxílio da graça, sem a qual não há luz para crer. Fica, porém, a pergunta a respeito do motivo pelo qual Deus concede a graça a alguns enquanto a outros não, como ocorreu com o bom e o mau ladrão. Haveria algum critério para isto ou a escolha é arbitrária? No Evangelho de São João há uma outra passagem que parece, pelo menos ao primeiro exame, sugerir que a escolha não é arbitrária:
diz Jesus,
Aqui Jesus afirma primeiro que a luz veio ao mundo, isto é, Ele próprio com a graça que, através dEle, Deus concede aos homens. Ao dizer que a luz veio ao mundo, Jesus parece não excluir ninguém; o mundo significa, no comum entendimento das pessoas, a totalidade dos homens. Desta passagem, portanto, parece deduzir-se que Deus não priva deliberadamente a ninguém da graça; antes, a coloca ao acesso de todos, do mundo todo, isto é, de todos os homens. Quem faz a seleção de quem receberá ou não a graça a todos oferecida, parece dizer Jesus, são as próprias pessoas, segundo o seu agir. Há os que fazem o mal e estes aborrecem a luz por uma certa conaturalidade; eles próprios, pelas obras más que fazem, não se aproximam da luz da graça porque por uma certa conaturalidade assim não o querem. Há outros que não fazem o mal, mas que procedem conforme a verdade; estes, pelo motivo oposto, tem uma certa conaturalidade para com a luz da graça e facilmente se aproximam dela, sendo como que inclinados a fazê-lo. Este parece, portanto, ser o motivo pelo qual alguns são movidos pela graça e outros não. Deus, na realidade, a deseja conceder a todos e ela está, de fato, ao acesso de todos, mas cada um, segundo uma inclinação resultante de suas próprias obras, tende a se aproximar ou a se afastar dela. A distribuição da graça entre os homens, portanto, não é fruto de uma arbitrariedade divina, e deve ter havido razões justíssimas, embora nós não as conheçamos, pelas quais o bom ladrão percebeu com tanta facilidade a realeza de Jesus nas mesmas condições em que o mau ladrão não conseguia ver absolutamente nada. Este raciocínio, porém, se analisado mais cuidadosamente, embora explique suficientemente como a distribuição da graça entre os homens não é feita de modo arbitrário por parte de Deus, não fornece, entretanto, uma explicação última a respeito do motivo por que alguns são movidos pela graça e outros não. De fato, ela novamente supõe que para aproximar-se da graça é preciso ser movido pela graça, enquanto que aqueles que não são movidos por ela não podem alcançá-la por suas próprias forças. Que isto seja assim, pode ser visto examinando novamente as palavras de Jesus. Jesus diz, na passagem citada, que a luz veio ao mundo e, ao dizer isto, quis dizer que veio para todos, indistintamente. Os homens, porém, não eram iguais no mundo; alguns praticavam o mal e por isso aborreciam a luz e não se aproximavam dela; outros, porém, havia que procediam conforme a verdade e se achegavam à mesma. Entretanto, para que se possa proceder conforme a verdade, é necessário já ser movido a tanto pela graça. De onde se conclui que se havia alguns que procediam conforme a verdade e se aproximavam da graça era porque já eram movidos por ela. Novamente é a própria graça que é a razão última da própria graça. Há sempre uma primeira graça que foi recebida, só a partir da qual é possível achegar-se a ela, e sem a qual nenhuma outra é possível. Para explicar a razão desta primeira graça poderia-se levantar uma hipótese fundamentada no fato de que a distinção elementar entre o bem e o mal pode ser feita no homem apenas através da razão, sem necessidade da graça, algo que não pode ser negado sem negar à inteligência humana os atributos próprios de sua natureza. A razão sendo suficiente para fazer estas distinções, pode-se concluir daqui que também as escolhas mais elementares entre o bem e o mal possam ser feitas pelo homem sem o auxílio da graça. Deste modo, de acordo com as suas escolhas voluntárias, o homem poderia adquirir uma afinidade para com a graça e aproximar- se ou não dela. Parece ademais apoiar esta hipótese um texto da Epístola aos Romanos, em que São Paulo diz que os pagãos, mesmo sem a Revelação, através da observação da natureza, podem entender suficientemente das coisas divinas o que lhes é necessário para glorificarem a Deus:
diz São Paulo,
Este raciocínio contém, efetivamente, muitos elementos de verdade. É certo que o homem pode, apenas pela razão, sem necessidade da graça, fazer distinções elementares entre o bem e o mal e pode, também, durante algum tempo, segui-las pelo agir. Mas, ainda que sem o auxílio da graça ele pudesse perseverar indefinidamente na escolha daquilo que ele assim reconhecesse ser o bem, isto não poderia conduzí-lo à luz da graça, pois esta supõe uma elevação das faculdades da alma que tornam seus atos conaturais a uma realidade acima da natureza humana, o que não pode ser obtido por nenhuma repetição de nenhum ato de ordem simplesmente natural. Só pode ser feito pela própria graça. Para aproximar-se da graça, portanto, é sempre preciso a própria graça. Quando Jesus diz que aqueles que procedem conforme a verdade se aproximam da luz, ele está se referindo àqueles que procedem já movidos pela luz da graça divina. Desta luz da graça não estão dispensados nem mesmo os pagãos que sem culpa nunca tenham ouvido falar de Cristo e da Revelação, conforme observa Hugo de São Vítor na Questão 40 do Comentário à Epístola aos Romanos, em que trata da passagem acima citada de São Paulo:
pergunta Hugo de São Vítor.
continua ele,
A salvação e a santificação do homem, portanto, estão na inteira dependência da graça. Para iniciar a caminhada até Deus, que principia pela fé, será sempre preciso um mínimo de graça e, se o homem não puder dispor deste mínimo, não poderá fazer nada, por si só, para obtê-lo. Resta apenas saber se há algum motivo pelo qual este mínimo necessário para que o homem inicie a caminhada até Deus é negado a algumas pessoas ou se se trata de uma escolha arbitrária de Deus. Para responder a esta questão podemos reformulá-la, como faz Hugo de São Vítor no Comentário à Epístola aos Romanos, e perguntar se Deus, ao conceder e negar a uns e outros este mínimo de graça não estará Ele próprio se tornando responsável pelos pecados que serão cometidos pelos que não a tiverem recebido. A pergunta tem sentido pois se sem esta graça os homens se afastam de Deus, certamente não poderão deixar de cair em pecado e a causa destes pecados terá sido o próprio Deus que lhes negou a graça sem cujo auxílio o homem não pode deixar de pecar.
comenta Hugo de São Vítor,
Que se pode deduzir destas palavras de Hugo de São Vítor? Deus não nega a ninguém a sua graça. Todos, algum dia, a tiveram, em quantidade suficiente para poderem salvar- se e empreender e ascensão de sua alma até Ele. Muitos, talvez todos, tiveram a graça inicial não apenas uma, mas muitas, inúmeras vezes. A nenhum ser humano Deus negou a sua graça sempre, em todo o tempo, desde o início até o fim de suas vidas. Ao contrário, diz São Paulo na Primeira Epístola a Timóteo que Deus
São Paulo não poderia ter dito isto se Deus concedesse a sua graça apenas a alguns enquanto que a negasse a outros sempre e durante todo o tempo, desde o início de suas vidas até à morte, pois sem a graça o homem, por mais inteligente que ele possa ser, não passa de um animal, inteiramente embotado para as coisas do céu, e sem nada que possa fazer para se libertar desta situação. Se fosse possível que tivesse existido algum homem a quem Deus jamais tivesse concedido um mínimo de sua graça, São Paulo deveria ter dito que Deus quer que alguns homens se percam e jamais cheguem ao conhecimento da verdade, pois o homem depende inteiramente de Deus para obter a graça inicial. Nada pode fazer por si para obtê-la e sem ela já está condenado. Nestas condições, Deus teria criado este homem para a condenação. Isto, porém, não pode ser verdade se é certo que Deus quer que todos se salvem; Deus, portanto, a todos concede a sua graça pelo menos uma vez, provavelmente muitas e freqüentemente uma multidão de inúmeras vezes. Se, quando isto ocorre, os homens se fazem dóceis à inspiração e à inclinação da graça, crendo nEle e caminhando da fé para a fé, passarão a se aproximar cada vez mais de seu Reino. No início, diz São Bento, o caminho lhes
Haverá outros, porém, que com inteira liberdade desprezarão a inspiração da graça e decidirão fazer exatamente o oposto do que ela inspira ou inclina. Estes poderão ser convidados novamente em outras ocasiões para o banquete celeste; nada, porém, poderá garantir-lhes que isto voltará a acontecer. A graça poderá retirar-se definitivamente do homem e este não poderá nem quererá mais salvar-se. Os homens se entregarão aos desejos da carne, trocarão a verdade pela mentira e passarão a adorar a criatura em vez de servir ao Criador. Inteiramente privados de inteligência, a razão de suas existências, em vez de ser o próprio Criador, única fonte de felicidade, passará a ser alguma forma de entidade criada, sempre inferior em dignidade a eles próprios, sem que eles sejam capazes de apreender a extensão da loucura que isto implica. Já estão condenados, pois embora seus corpos vivam uma vida biológica, suas almas já encontraram a morte espiritual. Destes mortos vivos foi que disse Jesus, ao responder a um jovem que desejava tempo para enterrar seu pai antes de começar a segui-lo:
No dia do juízo os homens que se condenarem verão que nada houve de injusto ao eles se terem visto privados da graça divina. Conhecerão todas as vezes em que esta lhes foi oferecida e como a desprezaram sistematicamente. Poderão vir a conhecer também a justiça desta disposição divina ao ser- lhes mostrado que se a graça lhes fosse oferecida outras mais vezes ainda, tantas outras a teriam desprezado. É uma tristeza imensa refletir sobre estas coisas, mas foi por causa delas que Jesus entregou a sua vida. Se alguém portanto, ao ler estas coisas, consegue perceber-se privado da ajuda da graça para elevar seus olhos ao Céu, procure lembrar-se que não terá sido a primeira vez que terá sido visitado pela graça e que em nenhuma das ocasiões anteriores terá sido visitado por ela pelos seus méritos, mas apenas pela misericórdia divina, que quer que todos os homens se salvem. Agora, porém, poderá ser a última vez que a porta estreita se abre, e, se isto acontecer, nada mais poderá fazer para salvar-se da morte do espírito que ele próprio terá merecido. Procure lembrar-se do soldado romano que, vivendo um destes momentos, aproveitou assustado aquela pequeníssima fagulha de lucidez para perguntar a São Paulo, que estava diante de si, o que deveria fazer para salvar-se. Recebeu do Apóstolo a seguinte resposta:
Naquele momento, movido pela graça divina, abriu-se a sua inteligência para entender alguma coisa do extraordinário alcance destas palavras que para outros tão pouco ou mesmo nada significam. Se este soldado tiver perseverado até o fim na vida da graça que então se lhe abriu através da fé, hoje ele está entre os bem aventurados, na glória da felicidade que não tem mais fim. É para ela que Deus fêz a todos nós e é nela que, como Pai, ele desejaria que todos nós estivéssemos. |