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O abade digno de presidir ao mosteiro deve lembrar-se
sempre daquilo que é chamado, e corresponder pelas ações ao nome de
superior. Com efeito, crê-se que no mosteiro ele faz as vezes de
Cristo, pois é chamado pelo mesmo cognome que Este, no dizer do
Apostolo:
"Recebestes o espirito de adoção de filhos,
no qual clamamos: Abba, Pai".
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Por isso o Abade nada deve ensinar, determinar ou ordenar, que seja
contrário ao preceito do Senhor, mas que a sua ordem e ensinamento,
como fermento de divina justiça, se espalhe na mente de seus
discípulos. Lembre-se sempre o Abade de que da sua doutrina e da
obediência dos discípulos , de ambas essas coisas, será feita
apreciação no tremendo juízo de Deus.
E saiba o Abade que é atribuído à culpa do pastor tudo
aquilo que o Pai de família puder encontrar de menos no progresso das
ovelhas. Em compensação, de outra maneira será, se a um rebanho
irrequieto e desobediente tiver sido dispensada toda a diligência do
pastor e oferecido todo empenho na cura de seus atos malsãos;
absolvido então o pastor no juízo do Senhor, diga ao mesmo com o
profeta:
"Não escondi vossa justiça em meu coração,
manifestei vossa verdade e a vossa salvação;
eles, porém, com desdém desprezaram-me".
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E então, finalmente, que prevaleça a própria morte como pena para as
ovelhas que desobedeceram aos seus cuidados.
Portanto, quando alguém recebe o nome de Abade, deve
presidir a seus discípulos usando de uma dupla doutrina, isto é,
apresente as coisas boas e santas mais pelas ações do que pelas
palavras, de modo que aos discípulos capazes de entendê-las proponha
os mandamentos do Senhor por palavras e aos duros de coração e aos
mais simples mostre os preceitos divinos pelas próprias ações. Assim,
tudo quanto ensinar aos discípulos como sendo nocivo, indique pela
sua maneira de agir que não se deve praticar, a fim de que, pregando
aos outros, não se torne ele próprio réprobo, e Deus não lhe diga um
dia como a um pecador:
"Por que narras as minhas leis
e anuncias o meu testamento pela tua boca?
Tu que odiaste a disciplina
e atiraste para tráz de ti as minhas palavras".
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E ainda:
"Vias o argueiro no olho de teu irmão
e não viste a trave no teu próprio".
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Que não seja feita por ele distinção de pessoas no mosteiro. Que um
não seja mais amado do que o outro, a não ser aquele que for
reconhecido melhor nas boas ações e na obediência. Não anteponha o
nascido livre ao originário de condição servil, a não ser que exista
outra causa razoável para isto; pois se parecer ao Abade que deve
fazê-lo por questão de justiça, fá-lo-á seja qual for a condição
social; caso contrário, mantenham todos os seus próprios lugares
porque, servo ou livre, somos todos um em Cristo e sob um só Senhor
caminhamos submissos na mesma milícia de servidão:
"Porque não há em Deus acepção de pessoas".
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Somente por um ponto somos por ele distinguidos, isto é, se formos
melhores do que os outros nas boas obras e humildes. Seja pois igual
a caridade dele para com todos; que uma só disciplina seja proposta a
todos, conforme os merecimentos de cada um.
Portanto, em sua doutrina deve sempre o Abade observar
aquela fórmula do Apóstolo:
"Repreende, exorta, admoesta",
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isto é, temperando as ocasiões umas com as outras, os carinhos com os
rigores, mostre a severidade de um mestre e o pio afeto de um pai.
Isto é, aos indisciplinados e inquietos deve repreender mais
duramente, mas aos obedientes, mansos e pacientes, deve exortar a que
progridam ainda mais e, quanto aos negligentes e desdenhosos,
advertimos que os repreenda e castigue. Não dissimule as faltas dos
culpados, mas logo que começarem a brotar ampute-as pela raiz, como
lhe for possível, lembrando-se da desgraça de Heli sacerdote de Silo.
Aos mais honestos e de ânimo compreensível censure por palavras em
primeira e segunda advertência; porém aos ímprobos, duros e soberbos
ou desobedientes reprima com varadas ou outro castigo corporal, desde
o início da falta, sabendo o que está escrito:
"O estulto não se corrige com palavras".
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E mais :
"Bate no filho com a vara
e livrarás a sua alma da morte".
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Deve sempre lembrar-se o Abade daquilo que é, lembrar-se de como é
chamado, e saber que daquele a quem mais se confia mais se exige. E
saiba que coisa difícil e árdua recebeu: reger as almas e servir aos
temperamentos de muitos; a este com carinho, àquele, porém, com
repreensões, a outro com persuasões. Segundo a maneira de ser ou a
inteligência de cada um, de tal modo se conforme e se adapte a todos e
que não somente não venha a sofrer perdas no rebanho que lhe foi
confiado, mas também se alegre com o aumento da boa grei.
Antes de tudo, que não trate com mais solicitude das
coisas transitórias, terrenas e caducas, negligenciando ou tendo em
pouco a salvação das almas que lhe foram confiadas, mas pense sempre
que recebeu almas a dirigir, das quais deverá também prestar contas.
E para que não venha, porventura, a alegar falta de recursos,
lembrar-se-á do que está escrito:
"Buscai primeiro o reino de Deus e sua justiça,
e todas as coisas serão dadas por acréscimo".
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E ainda :
"Nada falta aos que O temem".
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E saiba que quem recebeu almas a dirigir, deve preparar-se para
prestar contas. Saiba como certo que de todo o número de irmãos que
tiver possuído sob seu cuidado, no dia do Juízo deverá prestar contas
ao Senhor das almas de todos eles e mais, sem dúvida, também da sua
própria alma. E assim, temendo sempre a futura apreciação do pastor
acerca das ovelhas que lhe foram confiadas, enquanto cuida das contas
alheias, torna-se solícito para com as suas próprias, e enquanto com
suas exortações subministra a emenda aos outros, consegue ele próprio
emendar-se de seus vícios.
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