CAPÍTULO XXI. OS CONTINUADORES DE SUA OBRA.

Apenas oito dias após a morte do Irmão Pedro, nomeando sucessor de sua obra Frei Rodrigo da Cruz, voltou da Espanha Frei Antonio da Cruz, que quatro anos antes tinha sido enviado para procurar obter do rei da Espanha a autorização para fundar o Hospital dos Convalescentes.

Na Espanha, encontrou o apoio de D. Agustín Ponce de León, agente oficial de negócios do Rei no Conselho das Índias, o qual, admirando a obra, trabalhou com tenacidade e desinteresse para obter a autorização da rainha Maria Anna de Habsburgo-Áustria, concedendo as devidas licenças para a "fundação do hospital de Nossa Senhora de Belém na Guatemala, para convalescentes necessitados...".

Ainda antes de morrer, Pedro tinha podido perceber certo ciúme da parte de alguns membros da Ordem franciscana, porque sendo ele e os seus colaboradores Terciários franciscanos menores, mas trabalhando independentemente na realização de uma obra que, a cada dia, se tornava sempre maior e era a admiração da cidade, a reação humana fez que surgissem ciúme e rivalidade.

Especialmente na pessoa do Padre guardião, frei Juan de Araújo, superior do convento de São Francisco, encontraram muita oposição. Uma vez em que ele negou o hábito a alguns que o pediam, pois queriam entrar na comunidade Betlemita, ouviu-se dizer de Pedro:

- "Com esses incômodos não podemos seguir adiante. Quando chegar a licença da Corte, dever-se-á encontrar o modo de perpetuar a hospitalidade".

Frei Payo Enríquez de Ribera, Bispo da Guatemala ao qual recorreram os irmãos Betlemitas solicitando orientação e guia nesses problemas, fez com que eles observassem que não podia nem queria subverter os privilégios da Ordem Franciscana, mas também não queria impedir a maravilhosa obra de caridade e de serviço público que estavam desenvolvendo. Por isso, quando a situação chegou a um ponto crítico e pediram para que se constituísse uma ordem à parte, disse-lhes:

"Se vos apresentardes como simples seculares, obtereis a permissão de prosseguir na vossa obra".

Assim fizeram e estabeleceram constituições ou regulamentos próprios, apresentando-os à cúria para a aprovação.

Quando soube disso, o Padre Araújo foi ao encontro do Frade Payo para que lhe explicasse o inconveniente. Sua intervenção freou bruscamente as práticas e, logicamente, a notícia do desacordo entre Franciscanos e Betlemitas se espalhou rapidamente entre os habitantes da cidade. A situação se agravou quando se soube que um cavaleiro nicaraguense de grandes oportunidades econômicas e sociais, D. Juan Gómez de Trigo, havia pedido o hábito de irmão terciário para fazer parte dos Betlemitas e lhe fora negado. As pessoas comentavam, criticavam e rapidamente se formaram dois grupos.

Nesse meio tempo, os Betlemitas, agora encabeçados por Frei Rodrigo da Cruz, continuavam a trabalhar com tenacidade, pedindo esmolas e auxílios até verem o edifício de seu hospital concluído a poucos meses de distância da morte de Frei Pedro.

A rivalidade, contudo, continuava, especialmente no que se refere ao hábito, já que os Betlemitas continuavam a usar aquele dos terciários franciscanos e estes diziam que eles não pertenciam mais à sua Ordem. Por fim, um dia, chegou em visita à Guatemala o Padre Cristóbal de Xerez Serrano, notável guatemalteco que tinha sido elevado ao grau de inspetor. Este senhor, tendo examinado o caso e ouvido ambas as partes, com sabedoria salomônica aconselhou aos Betlemitas:

"Para que tenha fim essa discussão, mudai o hábito. Da minha parte, prometo todo auxílio".

Essa solução foi aceita, mas os Betlemitas fizeram observar que, considerando-se sempre franciscanos, teriam que levar o cordão de São Francisco debaixo do hábito que viessem a adotar.

Assim fizeram e, em 15 de outubro de 1667, os habitantes da Guatemala viram pela primeira vez o hábito betlemítico quando Frei Rodrigo da Cruz e os outros irmãos saíram à rua usando uma vestimenta de cor escura, que consistia num saco ou sotaina com colarinho, aberta até o joelho, com mangas normais abotoadas, manto longo até os pés e, em vez de colarinho no manto, um capuz costurado no próprio manto, que podia servir para cobrir a cabeça e proteger do sol e da chuva; as calças eram de tecido rústico, de cor marrom. [72]

Apresentaram-se diante de Frei Payo, que os felicitou pela mudança, aconselhando-os apenas que, pelo fato de que trabalhavam muito materialmente e necessitavam de agilidade nos movimentos, fizessem ainda outras pequenas modificações. Assim fizeram e seu hábito ficou definitivamente composto de uma túnica longa até o tornozelo, sem botões nem mangas, e com o manto mais curto, sem capuz; sobre o lado esquerdo do manto, uma lâmina em forma de escudo, sobre a qual estava pintado o Nascimento de Jesus Cristo.

Além disso, os Betlemitas decidiram usar, como outro sinal diferenciador, a barba longa, razão pela qual mais tarde, quando a ordem se estendeu à América do Sul, em muitos países, entre os quais o Peru e a Argentina, ficaram conhecidos como "os padres barbudos".

O modo pelo qual a Ordem Betlemita continuou a propagar-se com seus principais seguidores é narrado muito cuidadosamente pelo sacerdote Carlos E. Mesa, um biógrafo contemporâneo que nos diz: [73]

"Aprovados o hábito e as constituições, os Irmãos Betlemitas começaram a prosperar na vocação, nas fundações e nos exemplos de virtude".

"O primeiro a entrar foi Juan Gómez de Trigo, que se chamou Juan Pecador. Anos depois, foi autorizada admissão dos sacerdotes."

"A Congregação nascente se conservou fiel ao espírito do Fundador e à finalidade e à grandeza de sua obra de misericórdia. Junto às obras de misericórdia, floresceram igualmente, conforme o costume de Pedro, as espirituais, especialmente o ensinamento aos meninos pobres."

"O Envelope Real concedeu aos Betlemitas ter uma igreja pública e fazer soar os sinos. Muito mais tarde, foi aberta uma porta para a rua, na Sala que era a enfermaria, situada no ângulo que dá vista para a ponte Pensativo e que fica em frente à igreja da Santa Cruz. Era exatamente a mesma sala em que tinha morrido Frei Pedro. Ficou aberta ao serviço público de julho até dezembro de 1667, quando foi inaugurada a igreja de Nossa Senhora de Belém, graças à generosidade do Presidente do Real Tribunal da Guatemala, D. Francisco de Escobedo, o qual, às suas próprias custas, fez erigir um magnífico templo que custou mais de 55.000 pesos, sem contar a despesa para a lâmpada do Santíssimo, as doações para a Sacristia e um campo de ervas medicinais que foi muito útil."

"A igreja foi construída onde havia profetizado Frei Pedro. Foi inaugurada em dezembro de 1667, com uma solene novena que terminou no dia dos Inocentes. Pelas ruas cobertas de ramos e tapetes, foi transferido o Santíssimo da catedral, entre o badalar de sinos, a música de cornetas, bumbos e cornamusas. A procissão parou diante de cinco altares e foi dela que, na novena, participaram os membros do Real Tribunal, os Príncipes Eclesiásticos, Seculares, Religiosos, Clero, Nobreza e uma multidão numerosa."

"Já desde essa época a Congregação Betlemita era conhecida no Peru, no México e em Roma."

"O Envelope Real, que autorizava a fundação do hospital de Belém da Guatemala, permitiu que os Betlemitas se estabelecessem também no reino do Peru, famoso pela sua riqueza. Dois irmãos foram até a longínqua Lima, com carta de recomendação de Frei Rodrigo para o senhor conde de Lemos, D. Pedro Fernández de Castro."

"O vice-rei ficou fascinado com a figura de Frei Pedro, tal como tinha sido descrita num breve relatório que lhe ofereceram os emissários betlemitas, razão pela qual, além de lhes oferecer o hospital de Nossa Senhora do Carmo, que o doutor D. Antonio de Ávila estava construindo, deu carta branca a Frei Rodrigo da Cruz para todas as despesas que ocorreriam em sua viagem planejada para a Europa."

"O hospital betlemita da cidade de Lima tornou-se, com o passar dos anos, o mais célebre e magnífico de todas as Índias. Sua fundação ocorreu em 1672, dividindo com o de Guatemala a honra de sede geral."

"No ano seguinte, 1673, foi fundado o hospital "São Francisco Xavier", do México. Um ano depois, estabeleceram-se em Cajamarca, Trujilo, Cuzco e Potosi, no Peru, em Quito, no Equador; depois, em Havana, de Cuba; nas ilhas Canárias; em Buenos Aires, na Argentina."

"Apenas cinco anos após a morte de Frei Pedro, a Ordem Betlemita contava com 21 casas, dez na Nova Espanha (México) e onze no Peru; 253 religiosos, 1.260 doentes assistidos e numerosos alunos pobres nas suas escolas."

"No mesmo ano em que a instituição nascente se estabelecia em Lima, Frei Rodrigo da Cruz decidiu dirigir-se à Espanha para obter a confirmação do hospital nessa cidade e para tratar de vários pontos importantes da obra betlemita."

"Não foram fáceis as argumentações no Conselho Real das Índias, mas finalmente, graças à recomendação da duquesa de Abero, se obteve a confirmação solicitada. Fez ainda mais a duquesa: deu a Frei Rodrigo uma carta de recomendação para Roma, para onde ele se dirigiu em busca de bênçãos e aprovações da Santa Sé. O resultado foi ótimo. Em 1672, o Papa Clemente X dignou-se aprovar a congregação e as constituições."

"O governo de Frei Rodrigo foi muito vantajoso para a congregação de Belém. Aumentaram as vocações, foram fundados hospitais e escolas no México e no Peru; e foi garantida a observância religiosa em absoluta fidelidade a Frei Pedro, cuja lembrança permanecia sempre viva na Guatemala".

"No ano de 1681, Frei Rodrigo voltou à Espanha com alguns companheiros e obteve do Conselho das Índias a aprovação dos hospitais fundados até então e a subvenção de três mil escudos anuais para o Hospital de Nossa Senhora do Carmo, em Lima."

"Desejava alguma coisa mais: ir a Roma para obter da Santa Sé a transformação de seu Instituto hospitalar em Ordem religiosa."

"Para isso, pediu ao Conselho das Índias uma carta de apresentação e recomendação para o Embaixador da Espanha junto à Santa Sé. O Conselho Real se recusou e ordenou-lhe que voltasse imediatamente para as Índias."

"Mas a rainha Maria Anna, protetora dos Betlemitas, deu a Frei Rodrigo uma carta de recomendação direta ao Papa Inocêncio XI, o qual efetivamente recebeu com amabilidade o ilustre portador e lhe concedeu indulgências e privilégios. Quando o Irmão expôs seus propósitos de obter para o instituto a isenção da jurisdição do Ordinário e poder ser governado por um Geral, foram-lhe fechadas as portas e negadas as audiências nas congregações romanas. Frei Rodrigo não se desencorajou. Era um homem tenaz, de uma ideia só, de vontade férrea. Permaneceu em Roma, reiterou suas instâncias diante do Papa e da Sagrada Congregação dos Regulares e não desanimou com as recusas e desacordos. Por fim, o Cardeal Mellini, que tinha sido núncio na Espanha, falou com o Papa em favor da Congregação Betlemita e, então, Inocêncio XI, mediante a bula de 26 de março de 1687, permitiu que a confraria chamada dos Betlemitas se erigisse em Congregação regular sob a Regra de Santo Agostinho, imediatamente sujeita à Sé Apostólica, e tivesse um Superior Geral que, nesse caso, seria Frei Rodrigo da Cruz".

"Em 7 de maio de 1687, ele se consagrou solenemente e, em seguida, também os seus companheiros."

"Em 27 de julho de 1707, o Papa Clemente XI, através de uma bula, concedia à Congregação de Belém os mesmos privilégios de que gozavam as Ordens mendicantes, as Congregações dos Clérigos regulares, os Ministros dos enfermos e os Hospitaleiros da Caridade de Santo Hipólito mártir, nas Índias."

"Em 3 de abril de 1710, a Congregação foi transformada em Ordem religiosa."

Na Carta Apostólica, o Papa Clemente XI dizia:

"Em nome da Autoridade Apostólica, para norma dos presentes, perpetuamente erigimos e instituímos a dita Congregação dos Betlemitas das Índias Ocidentais na verdadeira Religião com votos solenes".

"Em 1780, foi impresso o Ritual Cerimonial da Ordem Hospitalar da Beata Virgem Maria, Senhora de Belém."

"Frei Rodrigo da Cruz, antes D. Rodrigo de Arias Maldonado e Salcedo, da família dos duques de Alba e Benavente, morreu santamente no México em 1715, com a idade de oitenta anos."

"A Ordem Betlemita realizou uma maravilhosa obra de caridade em todo o mundo americano de língua espanhola, do México até a Argentina. Nos albores de século XIX, que transcorreu convulso e sangrento nas províncias americanas que lutavam por sua independência, a Ordem contava com cinco noviciados que garantiam sua permanência na Guatemala, no México, em Cuzco, Quito e Havana. Os hospitais superavam o número de trinta."

"Algumas das suas escolas, como a de Belém em Havana, foram celebradas e exaltadas por sua obra apostólica. Basta lembrar que a Escola de Belém, aberta gratuitamente a todos em Havana, sem distinção de raça nem de classe, teve com o tempo mais de cinquenta alunos que estudavam de graça."

"Na nação da Guatemala, seu berço e, ao mesmo tempo, sepulcro do Fundador, a Ordem tinha, no século XIX, somente dois conventos: aquele da Antiga Guatemala (ou Santiago dos Cavaleiros) e aquele da Nova Guatemala da Assunção." [74]

"Este último foi um centro de agitação em favor da emancipação centro-americana. Talvez isso explique em grande parte o fato deplorável pelo qual as Cortes de Cádiz, por meio dos decretos de 27 de setembro e de 25 de outubro de 1820, decidiram a abolição da Ordem Betlemita na América."

"Deste modo foi cancelada uma das mais caridosas obras da cristandade."