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Retornando ao décimo livro do Comentário à Ética, Santo
Tomás de Aquino, seguindo a Aristóteles, faz interessantíssimas
considerações finais sobre a doutrina que acabou de expor.
A vida que descansa na contemplação da verdade, diz Tomás
de Aquino, é melhor do que a vida que é segundo o homem (68). A vida
segundo o homem é aquela pela qual o homem ordena segundo a razão os
afetos e as operações dos sentidos e do corpo. Mas somente repousar na
operação da inteligência parece ser algo próprio dos entes superiores ao
homem, nos quais não há corpo, mas somente uma natureza intelectiva, da
qual os homens tem uma participação segundo a sua inteligência. O homem
assim vivendo, isto é, repousando na contemplação, não vive mais
enquanto homem, pois enquanto homem ele é composto de diversos, isto é,
das operações da vida vegetativa, dos cinco sentidos, dos apetites
sensíveis e suas paixões, da imaginação, que é um prolongamento dos
cinco sentidos e da natureza intelectiva, mas vive segundo algo de
divino que nele existe, na medida em que segundo a inteligência
participa da semelhança divina. Concluímos, pois, diz S. Tomás seguindo
a Aristóteles, que assim como o intelecto, por comparação aos homens, é
algo de divino, assim também a vida especulativa segundo o intelecto
compara-se à vida moral assim como a vida divina se compara à
humana (69).
Diz Aristóteles, continua S. Tomás, que alguns poetas
afirmaram que o homem deveria pretender saber apenas o que é humano, e
os mortais saber apenas o que é mortal. Mas Aristóteles, diz S. Tomás,
declara falsa esta colocação, porque o homem deve pretender a
imortalidade o quanto possa, e fazer tudo o que puder para que viva
segundo o intelecto, que é o ótimo entre as coisas que há no homem. Já
tinha afirmado Aristóteles no IX da Ética que, para cada coisa, sua
melhor parte é aquela que é mais principal nela, porque todas as outras
são como que seus instrumentos. Assim, na medida em que o homem vive
segundo a operação do intelecto, vive segundo a vida maximamente própria
ao ser humano. Seria, entretanto, inconveniente se alguém escolhesse
viver não segundo a vida que lhe é própria, mas segundo a vida de algum
outro. De onde que inconvenientemente afirmaram, diz Aristóteles,
aqueles que exortaram a que o homem não devesse descansar na especulação
do intelecto (70). Esta vida, na verdade, é encontrada perfeitissimamente
nas substâncias superiores, (isto é, nos entes superiores ao homem), nos
homens, todavia, imperfeitamente e como que participativamente. E,
todavia, este pouco, continua S. Tomás comentando a Aristóteles, este
pouco é maior do que todas as outras coisas que há no homem (71).
Assim, portanto, conclui Tomás, é patente que aqueles que
descansam na especulação da verdade são maximamente felizes, tanto
quanto o homem nesta vida pode ser feliz (72).
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