Respondo dizendo que a providência diz respeito à ordenação dos meios ao fim e, portanto, quem quer que negue a causa final, necessariamente negará por conseqüência a providência, conforme diz o Comentador no II da Física.1. Dos que negaram na antigüidade a causa final houve duas posições. Alguns filósofos antiqüíssimos somente colocaram a existência da causa material de onde que, não negando a existência de uma causa agente, não puderam colocar também a existência de um fim, que não é a causa senão na medida em que move o agente. Outros filósofos posteriores, porém, colocaram a causa agente, nada dizendo da causa final. Segundo ambos estes filósofos, tudo procedia da necessidade imposta pelas causas assim chamadas precedentes, isto é, da matéria ou do agente. 2. Mas esta opinião é refutada pelos filósofos da seguinte maneira. As causas material e agente, enquanto tais, são apenas causa de ser para o efeito, mas não são suficientes para causar a bondade neste efeito, bondade segundo a qual o efeito seja conveniente em relação a si mesmo, de tal maneira que possa permanecer, e conveniente em relação a outros, de tal maneira que seja ajudado. Por exemplo, o calor, pela sua razão, o quanto é de si, tem a propriedade de dissolver; a dissolução, porém, não é conveniente e boa senão segundo um certo termo e modo, de onde que, se não colocássemos uma outra causa além do calor e outros agentes semelhantes na natureza, não poderíamos assinalar a causa pela qual as coisas se fazem bem e convenientemente. Ora, tudo o que não tem causa determinada acontece pelo acaso. De onde que é necessário que, segundo a posição anterior, todas as conveniências e utilidades que são encontradas nas coisas sejam casuais, isto é, por acaso; o que também Empédocles colocou, dizendo ter acontecido pelo acaso que, por uma afinidade que haveria entre os diversos elementos, deste modo, isto é, por acaso, acabaram se reunindo as diversas partes dos animais de tal maneira que os diversos animais pudessem ter-se conservado, e que este processo teria acontecido uma grande quantidade de vezes. Ora, isto não pode ser, porque as coisas que ocorrem pelo acaso ocorrem em menor parte, enquanto que vemos que tais conveniências e utilidades ocorrem nas obras da natureza ou sempre ou em sua maior parte, de onde que não pode ser que aconteçam em virtude do acaso e, assim, é necessário que procedem a partir da intenção de um fim. Aquilo, porém, que carece de inteligência ou conhecimento, não pode diretamente tender em direção a um fim, a não ser que por algum conhecimento lhe seja preestabelecido um fim e a ele seja dirigido. De onde que é necessário, já que as coisas naturais carecem de conhecimento, que preexista algum intelecto que ordene as coisas naturais ao seu fim, do modo pelo qual o arqueiro dá à flexa um certo movimento, para que tenda a um determinado fim. Daqui procede que assim como o ato de atingir o alvo, que é realizado pela flexa, não é tanto dito ser obra da flexa como do atirador, assim também toda obra da natureza é dita pelos filósofos obra da inteligência. 3. Assim, é necessário que o mundo seja governado pela providência daquele intelecto que impôs à natureza a ordem referida. E esta providência pela qual Deus governa o mundo assemelha-se à providência econômica, pela qual alguém governa a família, ou à providência política, pela qual alguém governa uma sociedade ou um reino, em que alguém governa os atos de outros a um fim. Pois não pode haver em Deus providência em relação a si mesmo, pois tudo o que há nEle é fim, e não meio para um fim. |