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Veremos que os teólogos místicos servem-se disto para falar das
hierarquias celestes e também para explicar os mistérios da Deidade.
Às vezes celebram-na com imagens muito eloqüentes; por exemplo,
quando dizem Sol de Justiça (Mal. 4, 2; Sab. 5, 6),
Estrela Matutina que se levanta até a Inteligência (II Pe.
1, 19; Apoc. 22, 16), Luz de fulgor intelectual (I
Jo. 1, 5; Mt. 5, 14). Em outros casos utilizam-se de
expressões mais terrenas. Comparam Deus com o fogo que arde sem
queimar (Ex. 3, 2; Sab. 18, 3; Ex. 13, 21), com a
água que comunica plenitude de vida, que metaforicamente chega às
entranhas e forma rios inesgotáveis (Jo. 4, 14; Jo. 7,
38; Prov. 18, 4). Utilizam também semelhanças de coisas
ordinárias, como ungüento suave (Cant. 1, 3; Is. 61, 1;
Jer. 1, 5; Atos 10, 36), pedra angular (Is. 28,
16; Ef. 2, 20). Chegam até a comparações de animais.
Atribuem a Deus propriedades do leão, da pantera, do leopardo, e
do urso devorador (Is. 31, 4; Os. 5, 14; 13, 7).
Acrescente-se o que parece mais abjeto e impróprio de tudo, a forma
de verme (Sl. 22, 6), com a qual representaram a Deus
admiráveis intérpretes dos mistérios divinos.
Deste modo os que conhecem sobre Deus, intérpretes sob misteriosa
inspiração, não misturam o Santo dos santos com coisas perfeitas e
profanas. Utilizam uma figura dessemelhante para que as realidades
divinas não se confundam com as imundas nem os fervorosos admiradores
dos símbolos divinos se apeguem a tais figuras como se tivessem uma
existência real. Assim, com verdadeiras negações e com
dessemelhanças, últimos reflexos divinos, honram a Deus como é
devido.
Nada, portanto, há de indigno em representar os seres celestes,
como ficou dito, por meio de semelhanças ou dessemelhanças
inadequadas ao objeto.
Em minha investigação ordinária esta dificuldade não me teria
estimulado a chegar a uma explicação exata das virtudes sagradas se
não tivesse tido problemas com as imagens da Escritura, disformes em
relação aos anjos. Minha mente não podia satisfazer-se com este
inadequado imaginário. Esta inquietação me conduziu a ir mais além
da representação material, passando santamente pelas aparências e
através delas elevando-me a realidades que não são deste mundo.
Porém seja suficiente o que já foi dito sobre as imagens materiais e
impróprias com que as Escrituras Sagradas se referem aos anjos.
Devo explicar agora o que entendo por hierarquia e que vantagens
oferece aos que dela participam. Que nesta exposição o meu guia seja
Cristo, meu Cristo, se é lícito assim falar, o inspirador de tudo
o que podemos conhecer sobre a hierarquia, e tu, meu filho, deves
seguir as recomendações de nossa tradição hierárquica. Escuta
devotamente estas sagradas e inspiradas considerações e esta doutrina
te servirá de iluminação. Guarda as santas verdades no recôndito
de tua alma. Preserva sua unidade diante da multiplicidade do profano
(I Tim. 6, 20) pois, como diz a Escritura, não é lícito
atirar aos porcos a pura, brilhante e esplêndida harmonia das pérolas
espirituais (Mt. 7, 6).
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