XVII

Santo Atanásio




1.

A definição de Santo Atanásio.

Santo Atanásio representa na história a exposição clássica da Fé Nicena. Como pensador cristão, situou-se em completo contraste com Ário e também com Eusébio de Cesaréia.

Tanto Ário como Eusébio de Cesaréia eram racionalistas que partiam de idéias a priori sobre a transcendência divina e a criação. Colocavam que o Verbo não poderia ser divino porque seu ser era originado do Pai; já que a natureza divina é incomunicável, o Verbo deve ser uma criatura, e qualquer condição especial que ele possuísse se deveria ao seu papel como agente do Pai na Criação.

Já na abordagem de Santo Atanásio as considerações filosóficas e cosmológicas constituíam uma menor parte, e seu pensamento condutor foi a convicção da Redenção: o homem, por sua comunhão com Cristo, foi feito divino e se tornou filho de Deus; portanto, o Verbo deve ser intrinsecamente divino, caso contrário ele nunca poderia ter concedido a vida divina aos homens.

Referências:
Santo Atanásio : De Syn. 51.

2.

A doutrina acerca do Verbo.

Deus não pode existir sem seu Verbo mais do que a luz pode deixar de brilhar. A geração do Verbo é um processo eterno; assim como

"O Pai é sempre bom por natureza,
assim é por natureza sempre generativo".

Não podemos, porém, concluir que o Filho é uma porção da substância divina separada do Pai; isto é impossível, porque a natureza divina é imaterial e sem partes.

A geração do Filho também não é, conforme afirmaram os arianos, o resultado de um ato definido da vontade do Pai, o que reduziria a condição do Filho à de uma criatura. Esta geração certamente acontece de acordo com a vontade do Pai, mas é um engano falar de um ato específico da vontade referindo-se a algo que é um processo eterno inerente à própria natureza de Deus.

Entretanto, enquanto gerado do Pai, o Filho é realmente distinto do Pai; e já que a geração é eterna, a distinção também é eterna, e não pertence simplesmente à `economia'.

Daqui para a unidade ou identidade da substância é apenas um passo, e Santo Atanásio não hesitou em dá-lo. Assim, ele declara que

"a divindade do Filho
é a divindade do Pai".

"O Filho é certamente distinto do Pai enquanto gerado,
mas enquanto Deus Ele é um e o mesmo;
Ele e o Pai são um
na união íntima de sua natureza
e na identidade de sua divindade".

"Assim Eles são um,
e a divindade do Filho
é predicado do Pai".

Os seres humanos podem, certamente, ser descritos como `consubstanciais' (`homoousios'), mas, neste caso, enquanto que a natureza humana que eles compartilham é necessariamente repartida entre indivíduos, de tal modo que eles não podem possuir uma única e mesma substância, a natureza divina é indivisível.

Referências:
Santo Atanásio : Contra Arianos 2,32; 3,66; 3,59-66; 3,4; 1,61; 3,41; 1,26; 1,28;
Idem : De Decret. 11,24;
Idem : Ad Serap. 2,3.

3.

Observação quanto à terminologia de Santo Atanásio.

Nas suas primeiras obras, Santo Atanásio não faz muito uso do termo `homoousios' para expressar a identidade numérica das substâncias, mas posteriormente veio a empregar a palavra chave do Concílio de Nicéia como sendo o único termo adequado para expressar o que ele acreditava ser a verdade sobre este assunto.

Porém ele não possuía um termo próprio para expressar a subsistência do Pai e do Filho como Pessoas, e parece ter discernido pouca ou nenhuma diferença entre os termos `ousia' e `hipóstase'.