Artigo 9

SE A DIVINA PROVIDÊNCIA
DISPÕE OS CORPOS INFERIORES
PELOS CORPOS CELESTES.




Respondo dizendo que a intenção geral de todos foi a de, na medida do possível, reduzir a multidão à unidade, e a variedade à uniformidade.

A. Os antigos, por isso, considerando a diversidade das ações nos corpos inferiores, pensaram em reduzí-los a alguns poucos e simples princípios, isto é, aos elementos, muitos ou mesmo um só, e às qualidades elementares. Esta posição, porém, não é razoável.

As qualidades elementares, de fato, são encontradas nas ações das coisas materiais como princípios instrumentais. Sinal disto é que não possuem o mesmo modo de ação em todas as coisas, não podendo as ações destas mesmas coisas chegar a um mesmo término. As qualidades elementares possuem um efeito no ouro, outro na madeira, outro na carne do animal, o que não aconteceria senão por agirem na medida em que são regulados por outro. A ação do agente principal, porém, não se reduz à ação do instrumento como ao seu princípio, mas inversamente, assim como o efeito da arte não deve ser atribuído à serra do artífice. De onde que os efeitos naturais não podem ser reduzidos às qualidades elementares como a primeiros princípios.

B. De onde que outros, isto é, os platônicos, reduziram a diversidade das ações nos corpos inferiores às formas simples e separadas como a primeiros princípios, a partir das quais, conforme diziam, proviria o ser e a geração nas coisas inferiores, assim como toda a propriedade natural. Mas isto também não pode ser, pois de uma causa que se encontra de um mesmo modo segue-se um efeito que se encontra também do mesmo modo; estas formas, porém, eram colocadas como sendo imóveis, de onde que seria necessário que a geração a partir delas fosse sempre uniforme nos corpos inferiores. É o contrário, porém, o que vemos pelos sentidos.

C. De onde que importa colocar que os princípios da geração e da corrupção e dos outros movimentos que se seguem nos corpos inferiores são algo que não se encontra sempre do mesmo modo. É necessário, todavia, que os primeiros princípios da geração e da corrupção sempre permaneçam, de tal maneira que a geração possa ser contínua. É necessário, por isso, que eles sejam invariáveis segundo a substância, e que se movam segundo o lugar para que, pela aproximação e pelo afastamento e pelos movimentos vários e contrários produzam efeitos contrários e diversos nos corpos inferiores. Estes são os corpos celestes, e por isso é necessário reduzir todos os efeitos a estes assim como a causas.

D. Mas nesta redução houve dois erros.

a. Alguns, de fato, reduziram os corpos inferiores aos celestes como a causas primeiras simplesmente consideradas, pelo fato de julgarem não existir nenhuma substância incorpórea. Diziam, por isso, que os primeiros nos corpos seriam também os primeiros nos entes.

Isto, porém, é manifestamente falso. É necessário, de fato, que tudo o que é movido seja reduzido a um princípio imóvel, já que nada se move a si mesmo e não se pode prosseguir de causa em causa até o infinito. O corpo celeste porém, embora não varie segundo a geração e a corrupção ou segundo algum movimento que varie algo que esteja em sua substância, é movido segundo o lugar. É necessário, portanto, fazer-se a redução a algum primeiro princípio de maneira que assim como as coisas que são alteradas podem ser reduzidas, por uma certa ordem, a um alterante não alterado movido, todavia, segundo o lugar, este também, ulteriormente, possa ser reduzido ao que de nenhum modo é movido.

b. Alguns, porém, colocaram os corpos celestes serem causas dos corpos inferiores não somente quanto ao movimento, mas também quanto à sua primeira instituição. É assim que Avicenna diz na sua Metafísica que a partir daquilo que é comum a todos os corpos celestes, isto é, a natureza do movimento circular, é causado nos corpos inferiores aquilo que lhes é comum, isto é, a matéria primeira, e a partir daquilo em que os corpos celestes diferem entre si é causada a diversidade das formas nos corpos inferiores, de modo que os corpos celestes são intermediários entre Deus e os corpos inferiores inclusive, de certa maneira, na criação.

Isto, porém, é alheio à fé, a qual coloca a natureza de todas as coisas segundo a sua primeira instituição ter sido feita imediatamente por Deus.

Que uma natureza, porém, seja movida por outra, pressupostas as virtudes naturais de ambas as criaturas conferidas por obra divina, não é contra a fé. Colocamos, por isto, os corpos celestes serem causas dos corpos inferiores somente por via de movimento, sendo assim intermediários na obra do governo, não, porém, na obra da criação.