69. |
Resta analisar agora a evolução do ensino secundário dentro do quadro anteriormente descrito, que é o principal tema deste trabalho. Conforme vimos, o movimento renovador dos anos 20 somente atingiu os governos estaduais, os quais, porém, não podiam reformar mais do que a rede primária. |
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Conforme vimos também, durante o Império o único estabelecimento secundário que dava certificados de conclusão de curso com direito a ingresso no ensino superior era o Colégio Pedro II do Rio de Janeiro. As províncias, ao longo da história do Império, tentaram e conseguiram em boa parte aglutinar as aulas régias avulsas em Liceus Provinciais que deveriam constituir um curso secundário, mas como o certificado de conclusão não era necessário para a matrícula na faculdade, e sim os exames parcelados, tal sistema não prosperou. De modo geral o ensino secundário no Brasil era constituído de cursos onde os alunos visavam apenas a realização dos exames parcelados preparatórios feitos em geral nas próprias faculdades de ensino superior. |
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Instituída a República e tendo Benjamin Constant ocupado a pasta de Ministro da Educação, Correios e Telégrafos durante o curto tempo em que tal cargo existiu, instituiu, antes mesmo da promulgação da nova constituição, a obrigatoriedade de se realizarem exames de madureza para receber um certificado equivalente à conclusão do curso secundário para poder-se ingressar na faculdade, abolindo, no lugar dos exames de madureza, os exames preparatórios parcelados. No dizer de Jorge Nagle,
Porém com a entrada em vigor da Constituição Republicana, que atribuiu ao Congresso a incumbência de legislar e organizar o sistema de ensino federal, o Congresso foi votando decretos adiando sucessivamente o prazo da obrigatoriedade do exame de madureza e depois, durante um período de nove anos seguidos, votando uma série de
até torná-lo inoperante. |
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Faria parte do plano de Benjamin Constant ademais, propor aos Liceus secundários estaduais que, se se conformassem ao mesmos regulamentos internos do Ginásio Nacional, o Colégio Pedro II do Império, o governo federal reconheceria o certificado de conclusão expedido pelos Liceus, equiparando estes estabelecimentos ao do Ginásio Nacional, dispensando com isto o aluno formado do exame de madureza e habilitando-o ao ingresso direto no ensino superior. Somente os estabelecimentos estaduais, porém, e não a iniciativa privada, poderia beneficiar-se desta regalia. |
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Em 1901, uma década mais tarde, o Ministério da Educação, Correios e Telégrafos já estava extinto há muito tempo e a Educação havia passado à alçada das atribuições do Ministério da Justiça. O então ministro Epitássio Pessoa, considerando a inoperacionalidade da Reforma de Benjamin Constant devido às medidas tomadas pelo Congresso, elaborou uma segunda reforma re-instituindo o exame de madureza para comprovar os estudos secundários realizados e estendendo o previlégio da equiparação ao Ginásio Nacional para qualquer instituição de ensino secundário, fosse esta estadual, municipal ou particular. Embora mantendo o exame de madureza,
no entender de Jorge Nagle a intenção do Governo seria obter uma reforma no ensino secundário principalmente através do mecanismo de equiparação ao Ginásio Nacional. |
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A reforma de Epitássio Pessoa porém não conseguiu também entrar em vigor, porque o Congresso Nacional novamente adiou sucessivamente por quase uma década a entrada em vigor da obrigatoriedade dos exames de madureza, além de votar novas disposições legais que, acumulando-se, vieram a anular muitos dos dispositivos da reforma. O dispositivo da equiparação foi realizado, mas a fiscalização era burlada de tal maneira que os melhores estabelecimentos de ensino apresentavam como uma de suas qualidade o fato de seus cursos não serem equiparados. Segundo José Antônio Tobias, uma década mais tarde o ministro da Justiça responsável pela educação diria:
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Foi assim que 10 anos após a Reforma Epitássio Pessoa surgiu a terceira reforma proposta pelo Ministro Ridávia Correia. Promulgada em 1911, consistiu em revogar formalmente a Reforma de Epitássio Pessoa, eliminando o exame de madureza e a equiparação dos estabelecimentos de ensino secundário ao Ginásio Nacional. Mas com ela, em vez de se retornar ao estado em que a educação estava quando a República a recebeu do Império, voltou-se ainda mais atrás porque, segundo José Antônio Tobias, com ela o Estado resolveu retirar toda e qualquer interferência sua no setor educacional, estabelecendo um ensino totalmente livre, julgando que assim o ensino poderia desenvolver-se de acordo com as necessidades imediatas do Brasil. Neste sentido, além de revogar o exame de madureza e a equiparação das instituições educacionais com o Ginásio Nacional, foi abolido não só o reconhecimento oficial dos certificados de conclusão dos cursos secundários das escolas equiparadas, como também foram abolidos até os certificados de conclusão do próprio Ginásio Nacional, que já vinham sendo expedidos há quase um século com direito a ingresso imediato nos cursos superiores. Foi extinto, desta maneira, do ponto de vista legal, o ensino secundário no Brasil. Ademais, foram também extintos os já problemáticos exames preparatórios parcelados que, embora fossem feitos em geral junto às faculdades, não eram, pelo menos do ponto de vista jurídico, um exame de admissão, mas constituíam uma espécie de atestado de estudos secundários. Daí para a frente não era mais necessário comprovar estudos secundários, e esta forma de ensino entrava em regime da mais ampla autonomia, existindo apenas um exame de admissão ao ensino superior pela faculdade interessada em receber o aluno. |
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Curiosamente a Reforma Rivadávia Correia que acabamos de comentar, intitulada Lei Orgânica do Ensino Superior e Fundamental de 5 de abril de 1911, ao contrário das demais, não teve dificuldades para ser implantada, entrando imediatamente em vigor sem entraves por parte do Congresso Nacional. O resultado colhido desta liberdade geral, entretanto, em vez do desenvolvimento gradual do ensino secundário segundo as necessidades brasileiras, conforme se esperava, foi o caos geral da educação. Quatro anos depois a terceira reforma teria que ser novamente reformada. |
77. |
A quarta reforma veio em 1915, de autoria do Ministro da Justiça Carlos Maximiliano. Segundo ela,
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Por esta época a rede de ensino secundário consistia do Ginásio Nacional, mantido pelo Governo Federal no Rio de Janeiro e por um ginásio modelo equiparado mantido em cada capital de Estado pelos governos estaduais, embora alguns estados não os possuíssem. A iniciativa particular portanto, segundo Nagle, assumiu na prática a responsabilidade de ministrar o ensino secundário, os alunos obtendo seus certificados mediante aprovação nos exames preparatórios parcelados realizados junto a estabelecimentos de ensino oficial. A escassez de estabelecimentos define, segundo Nagle, o caráter altamente seletivo do ensino secundário. A intenção não era fornecer esta modalidade de ensino à massa da população do Brasil, mas apenas preparar aquelas poucas pessoas que iriam cursar os estabelecimentos de nível superior. Taxas, selos e contribuições concorriam para que as escolas secundárias, públicas e particulares, além de reduzidas em números, fossem pagas e, mais do que isso, caras. |
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A última reforma do ensino secundário ocorrida na Primeira República deu-se em 1925 por iniciativa do Ministro João Luís Alves.O objetivo desta reforma era acabar com o instituto dos exames preparatórias parcelados e iniciar a implantação generalizada do curso secundário seriado e com freqüência obrigatória. Para tanto decidiu-se que:
De acordo com o Ministro da Justiça, esta remodelação
Para tanto a lei especificava que
Ademais, a freqüência às aulas se tornando obrigatório, o número de faltas importaria no impedimento do aluno para prestar exames. |
80. |
Ao pretender eliminar os exames preparatórios parcelados e instituir a obrigatoriedade do ensino secundário seriado a Reforma João Luís Alves buscava ressaltar o aspecto formativo do ensino secundário, embora pouco se tenha feito no sentido de uma disseminação mais ampla deste tipo de ensino para a população em geral. Mas mesmo este aspecto foi subseqüentemente neutralizado por uma série de medidas tomadas pelo Congresso Nacional. Segundo Jorge Nagle, o aspecto mais importante desta reforma, a passagem dos estudos fragmentários para os seriados, marcou época não por ter obtido os resultados desejados, conforme veremos em seguida, mas por ter representado um elo importante na série de reformas por que passou depois a escola secundária no Brasil, apontando na direção que após a Primeira República iria ser definitivamente seguida. |
81. |
O primeiro problema da Reforma João Luís Alves estava já dentro do próprio texto da lei que a promulgou. Embora instituísse um ensino secundário de seis anos, onde no sexto ano estavam incluídas matérias como Literatura Brasileira, Literatura das Línguas Latinas, História da Filosofia e da Sociologia, o artigo 54 prescrevia que seria suficiente o certificado de aprovação final do quinto ano para a prestação de exame vestibular para matrícula em qualquer curso superior. Com isto aconteceu que no ensino secundário o sexto ano nunca era cursado, porque os alunos o viam simplesmente como uma passagem para o curso superior. |
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Ademais, diz Nagle, do ponto de vista dos estudantes e de suas famílias, não havia clima para deixar de se pensar no secundário como mecanismo de ascensão social. Por isso muitas normas de 1925 foram imediatamente combatidas e sob forte pressão, o Governo Federal foi obrigado a recuar. O Congresso Nacional elaborou e acolheu normas com o objetivo de retornar na prática à situação criada pela reforma anterior. Dentre as havidas, Nagle cita que:
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83. |
Em 1926 o problema do ensino secundário foi duramente analisado pelo inquérito promovido por Fernando de Azevedo publicado no “Estado de São Paulo”, e o foi novamente em 1929 pelo IIIº Congresso da ABE. Algumas passagens das entrevistas realizadas por Fernando de Azevedo no seu inquérito, ao mesmo tempo em que pela linguagem coloquial oferecem uma idéia mais viva do que na época se pensava a respeito da situação do ensino secundário, podem servir também de conclusão para este trabalho. |
84. |
A última parte do inquérito de 1926 referia-se ao ensino secundário e superior. Após uma introdução de Fernando de Azevedo, oito personalidades famosas do meio educacional da época são entrevistadas, às quais foram submetidas 12 perguntas, as mesmas para todos os participantes. A primeira pergunta, de cujas respostas extraímos as passagens abaixo era, segundo a opinião de cada entrevistado, a respeito da causa do insucesso quase completo das repitidas reformas que tinham reorganizado o ensino secundário durante a República. Após os depoimentos, Fernando Azevedo ainda redige duas conclusões finais. |
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Tem então a palavra Fernando de Azevedo:
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Fala Rui Paula Souza:
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87. |
Fala Mário de Souza Lima:
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Fala Ovídio Pires de Campos:
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89. |
Fala Reinaldo Porchat:
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90. |
Finalmente, conclui Fernando de Azevedo:
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Com estas palavras finais de Fernando de Azevedo é chegado o momento também para nós de dar por encerrada esta nossa exposição sobre a situação do ensino secundário durante a Primeira República. |
(1) HUGO DE SÃO VITOR, De modo discendi et meditandi, in Migne, Patrologia Latina,
vol 176, 875-9.
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