17.

A Medicina da Alma, C. 8.

Há diversidade entre as delícias do corpo e as delícias do coração.

Quando não temos o alimento corporal, o corpo é atormentado por um grande desejo e afeto da carne. Quando, porém, é possuído e comido, pela saturidade alcança-se o fastídio. Ao contrário, quando não se possui o alimento espiritual, tornamo-nos vis; saboreado, porém, pelo que o come, este passa a ter fome por um desejo maior.

No alimento corporal o apetite gera a saciedade, e a saciedade gera o fastídio. No alimento espiritual o apetite gera a saciedade, mas a saciedade aumenta o desejo.

No alimento corporal a saciedade causa dano, e o fastídio desagrado. No alimento espiritual nem a saciedade é perigosa, nem o desejo atormenta. Este alimento é a palavra do ensinamento da vida que, servindo ordenadamente às virtudes, conservam incolumemente o estado da complexão humana. A alma apetece a refeição da doutrina, quando ouve e retém de boa vontade a palavra da pregação, quando a recebe pelo ouvido do coração e a repassa guardada no ventre da MEMÓRIA.

Existem alguns que não apetecem nenhum alimento, mas se esfastiam de todos. Há também os que apetecem alguns alimentos mas, quando os recebem, rapidamente os vomitam. Há ainda os que os apetecem e os retém, mas dele não fazem nenhuma digestão para os membros. Há outros, finalmente, que os apetecem, retém e digerem, mas que não expulsam pelas funções naturais aquilo que deveria ser expulso.

Aqueles que não apetecem mas se enfastiam do alimento da doutrina não poderão viver muito tempo. Destes é que está escrito:

"A sua alma aborrecia toda a comida,
e chegaram às portas da morte".

Salmo 106, 18

Aqueles que, de fato, se recusam a ouvir a palavra da pregação, correm já velozmente para a porta da condenação eterna.

Aqueles que apetecem mas não retém o alimento, expulsando-o do ventre da MEMÓRIA e lesando o estômago da mente, permanecem longamente doentes.

Há os que o apetecem e retém, mas não o digerem pelos membros, porque aquilo que o ventre da MEMÓRIA retém, não o convertem em bons atos.

Aqueles, finalmente, que não expulsam o que deveria ser expulso são aqueles que incorporam ao seus costumes o que não convém.