13.

Fundação dos conventos de Saint Jacques de Paris e de São Nicolau de Bolonha

Os religiosos que Domingos enviara para Paris, depois da assembléia de Prouille, dividiram-se em dois grupos. O primeiro, composto de Mannes, de Miguel de Fabre e de Oderico, chegara ao seu destino a 12 de setembro; o segundo, composto de Mateus de França, de Bertrand de Garrigua, de João de Navarra e de Lourenço de Inglaterra, chegou três semanas mais tarde. Alojaram-se todos no centro da cidade, numa casa que alugaram ao pé do hospital de Notre-Dame às portas do paço episcopal. À exceção de Mateus de França, que passara uma parte da sua mocidade nas escolas da Universidade, nenhum deles era conhecido em Paris. Ali viveram dez meses numa extrema penúria, mas fortalecidos com a memória de Domingos e com uma revelação que Lourenço de Inglaterra tivera sobre o futuro local, onde se haviam de estabelecer.

Por esse tempo, fundara João de Barastre, deão de S. Quintino, capelão do rei e professor na Universidade de Paris, junto a uma das portas da cidade, chamada a porta de Narbonne ou de Orléans, um hospício para estrangeiros pobres. A capela do, hospício era dedicada ao apóstolo S. Tiago, tão célebre em Espanha, e cujo túmulo é objeto de uma das maiores peregrinações do mundo inteiro. Fosse porque os frades espanhóis ali aparecessem por devoção, ou fosse por qualquer outro motivo, o certo é que João de Barastre veio a saber que havia em Paris uns novos religiosos que pregavam o Evangelho à maneira dos Apóstolos. Conhecendo-os, admirou-os, afeiçoou-se-lhes e reconheceu certamente a importância da sua instituição, porque a 6 de agosto de 1218 deu-lhes a posse dessa casa de S. Tiago, que ele preparara para Jesus Cristo na pessoa dos estrangeiros. Jesus Cristo, reconhecido, enviou-lhe hóspedes mais ilustres do que aqueles com quem contava, tornando-se o modesto asilo da porta de Orléans uma habitação de Apóstolos, uma escola de sábios, e a sepultura dos reis. A 3 de Maio de 1221, João de Barastre confirmou por um ato autêntico a doação que fizera aos religiosos, e a Universidade de Paris, a rogos de Honório III, abandonou os direitos, que tinha sobre esse estabelecimento, estipulando todavia que aos seus doutores, quando morressem, lhes seriam feitos os mesmos sufrágios espirituais, a titulo de confraria, como aos membros da ordem.

Tendo desse modo adquirido uma habitação fixa e pública, começaram os religiosos a ser mais conhecidos. Vinham muitos ouvi-los e eles faziam muitas conquistas entre os inumeráveis estudantes que de todos os pontos da Europa levavam para Paris o ardor comum da sua mocidade e o caráter diverso das suas nacionalidades. No fim do verão de 1219 contava o convento de Saint-Jacques trinta religiosos. Dentre os que nessa época tomaram o hábito, o único, cuja memória se conservou até aos nossos dias, foi Henrique de Marbourg. Fôra enviado alguns anos antes para Paris por um de seus tios, cavaleiro piedoso que habitava a cidade de Marbourg. Falecendo esse tio, apareceu-lhe depois em sonhos, e disse-lhe:

“Toma a cruz em expiação das minhas culpas,
e atravessa os mares.
Quando voltares de Jerusalém,
acharás em Paris uma nova ordem de Pregadores,
à qual te entregarás;
que te não atemorize a sua pobreza
e não os desprezes por serem poucos;
porque eles virão a ser um povo
e fortificar-se-ão para salvação de muitos homens”.

Gerard de Frachet
Vida dos Frades, L. IX, c. 13

Atravessou com efeito Henrique o mar e, voltando para Paris na ocasião em que os Pregadores se começaram a estabelecer, abraçou sem hesitar a sua instituição. Veio ele a ser um dos primeiros e mais célebres pregadores do convento de Saint-Jacques. O rei S. Luiz .afeiçoou-se muito a ele e levou-o consigo para a Palestina, no ano de 1254. Morreu à volta na companhia do rei.

Eis um caso que ele contava sobre os princípios da Ordem em Paris.

“Acontecera que dois Frades itinerantes
ainda nada tinham comido
até ás três horas da tarde
e perguntavam-se, um ao outro,
como poderiam mitigar a sua fome
no país pobre e desconhecido que atravessavam.
Quando estavam com esta conversa,
apareceu-lhes um homem em traje de viajante
e disse-lhes:

‘De que vos ocupais,
homens de pouca fé?
Buscai primeiro o reino de Deus,
e o resto vos será dado com abundância.
Tivestes fé suficiente
para vos sacrificardes a Deus;
e agora tendes receio
de que Ele vos deixe sem alimento?
Atravessai esse campo
e quando chegardes ao vale
que fica em baixo,
achareis uma aldeia;
entrai na igreja
e logo o prior da igreja vos convidará;
nisto sobrevirá um cavaleiro
que há de querer quase à força
levar-vos com ele,
mas intervindo o padroeiro da igreja,
este vos levará a vós,
ao padre e ao cavaleiro,
para sua casa, onde vos tratará suntuosamente.
Tende pois confiança no Senhor,
e exortai os vossos irmãos a essa mesma confiança’.

Dito isto desapareceu,
passando-se tudo como ele havia predito.

Os Religiosos, quando voltaram para Paris,
contaram o que tinha acontecido a Frei Henrique,
e ao pequenino numero de pobríssimos religiosos
que ali havia então”.

Gérard de Frachet
Vida dos Frades, L. I, c. 5

Esta extrema penúria dos Religiosos foi provavelmente o que deu motivo a que dois deles, João de Navarra e Lourenço de Inglaterra, fossem ter com Domingos a Roma. O santo, assim que eles chegaram, no mês de janeiro de 1218, ordenou a João de Navarra que fosse para Bolonha acompanhado de outro religioso a quem os historiadores chamam um tal Bertrand, para distinguirem de Bertrand de Garrigua. Enviou-lhes pouco depois Miguel de Uzero e Domingos de Segóvia, chegados de Espanha, e três outros frades, Ricardo, Cristiano e Pedro, sendo este último só converso. Esta pequena colônia, não se sabe corno, arranjou em Bolonha, uma casa e uma igreja, chamadas Santa Maria de Mascarella. Vivia contudo numa profunda miséria e, sem poder aliviá-la numa grande cidade onde a religião, os negócios e os prazeres têm o seu giro certo e onde tudo o que é novo só dificilmente interessa. Tudo porém mudou de figura, com a chegada de um só homem. Apareceu Reinaldo em Bolonha a 21 de dezembro de 1218, voltando da Terra Santa, e logo revolveu a cidade inteira. Nada se pode comparar a esse triunfo de eloqüência divina. Em oito dias Reinaldo estava senhor de Bolonha. Eclesiásticos, jurisconsultos, professores e estudantes da Universidade, todos ambicionavam entrar para uma ordem ontem ainda desconhecida ou desprezada. Os grandes talentos chegavam a recear ouvir o orador, temendo ficar seduzidos pela sua palavra.

“Quando frei Reinaldo,
de santa memória,
outrora deão de Orléans”,

diz um historiador,

“pregava em Bolonha
e atraía à ordem eclesiásticos
e doutores de fama,
começou mestre Moneta,
então professor das artes
e célebre em toda a Lombardia,
vendo a conversão de tantos homens,
a recear por si próprio.
Por conseguinte tinha todo o cuidado
em evitar frei Reinaldo,
e desviava dele os seus discípulos.
Mas eles, no dia da festa de Santo Estêvão,
convenceram-no a ir ao sermão,
e não podendo ele abster-se de lá ir,
por causa deles, ou por qualquer outro motivo,
disse-lhes:

`Vamos primeiro a Saint-Procul ouvir missa’.

Foram, com efeito,
e ouviram não só uma, mas três missas.

Moneta demorava-se propositadamente
para não assistir ao sermão.
Porém, instando seus discípulos com ele,
acabou por lhes dizer:

`Vamos agora’.

Quando chegaram à igreja
não tinha acabado o sermão,
e era tão grande a multidão de gente
que Moneta viu-se obrigado a ficar à porta.
Apenas começou a prestar atenção
sentiu-se logo vencido.
Exclamava nesse momento o orador:

`Vejo os céus abertos!
Os céus estão abertos para quem quiser entrar;
as suas portas estão abertas
para quem as quiser transpor.
Não cerreis o vosso coração,
nem a vossa boca,
nem as vossas mãos,
com receio de que os céus se fechem.
Porque tardais tanto?
Os céus estão abertos”.

Apenas Reinaldo desceu do púlpito,
Moneta, cujo coração Deus tocara,
foi procurá-lo, expôs-lhe a sua situação
e as suas ocupações,
e fez na presença dele voto de obediência.
Como porém, estava preso por muitos compromissos,
ainda conservou o traje secular durante um ano
com o consentimento de Fr. Reinaldo,
trabalhando, contudo, com todas as suas forças,
por lhe trazer ouvintes e discípulos.
Ora trazia um, ora outro,
e cada vez que fazia uma conquista,
parecia tomar o hábito com aquele que o tomara”.

Gérard de Frachet,
Vida dos Frades, L. IV, c. 10

O convento de Santa Maria de Mascarella já não chegava para os religiosos. Obteve então Reinaldo do Bispo de Bolonha, por intermédio do cardeal Ugolino, nesse tempo legado apostólico naquela província, a igreja de Saint Nicolas des Vignes, situada peito dos muros da cidade no meio de campos. O capelão da igreja, chamado Rodolfo, homem bom e temente a Deus, longe de se opor à generosidade do bispo para com os religiosos, tomou ele próprio o hábito. Contava ele que antes da chegada dos religiosos a Bolonha havia ali uma pobre mulher, desprezada de todos, porém querida de Deus, que muitas vezes se punha de joelhos em oração ao pé de uma certa vinha onde se fundou mais tarde o convento de Saint Nicolas e, quando zombavam dela vendo-a rezar com a cara virada para essa vinha respondia:

“Ó desgraçados e insensatos que sois!
Se soubéesseis que qualidade de homens
virão habitar este lugar
e as cousas que se hão de dar aqui,
vós mesmos vos prostraríeis em adoração
diante de Deus,
porque o mundo inteiro há de ser iluminado
por aqueles que aqui virão viver”.

Id., L.I, c. 3

“Outro religioso,
João de Bolonha,
contava que os cultivadores de Saint Nicolas
viam ali freqüentes vezes
luzes e aparições resplandecentes.
Fr. Clerin lembra-se de que na sua infância,
passando um dia junto dessa vinha,
seu pai, que o acompanhava,
lhe disse:

`Meu filho,
aqui ouve-se a miúdo o canto dos anjos,
o que é um grande presságio para o futuro’.

E, observando-lhe o filho que talvez
fossem vozes de homens
que se ouvissem,
respondeu-lhe seu pai:

`Meu filho, uma coisa é a voz dos homens,
outra a dos anjos,
e é impossível confundi-las”.

Gérard de Frachet
Vida dos Frades, L. I, c. 3

Mudando-se os frades para Saint Nicolas na primavera de 1219, continuaram aí a multiplicar-se, devido às pregações de Reinaldo, ao perfume das suas virtudes e à protecção de Deus que de tempos a tempos se manifestava por fatos maravilhosos. Um estudante da Universidade foi chamado a entrar para a ordem da seguinte maneira. Uma noite, enquanto dormia, viu-se só no meio de um campo onde o surpreende uma tempestade. Corre para a primeira casa que vê, bate à porta, pede hospitalidade ; mas uma voz responde-lhe:

“Eu sou a justiça,
e porque tu não és justo,
não entrarás em minha casa”.

Bate a outra porta, e outra voz lhe responde:

“Eu sou a Verdade,
e não te recebo,
porque a Verdade não salva
senão os que a amam”.

Dirige-se para outro lado, ali também o repelem, dizendo-lhe:

“Eu sou a Paz,
e não há paz para o ímpio,
mas só para os homens de boa vontade”.

Por fim bate a uma última porta e alguém, abrindo-lha, lhe diz:

“Eu sou a Misericórdia.
Se queres escapar à tempestade,
vai ao convento de Saint Nicolas
onde habitam os Frades Pregadores,
aí encontrarás o estábulo da penitência,
o presépio da continência,
a erva da doutrina,
o jumento da simplicidade,
o boi da discrição,
Maria que te iluminará,
José que te ajudará
e Jesus que te salvará”.

Gérard de Frachet,
Vida dos Frades, L. I, c. III

Acordando o estudante, em seguida a este sonho tomou-o por um aviso do Céu e obedeceu-lhe.

Nenhum atrativo humano cooperava nestas conversões de mancebos e de homens já adiantados na carreira da vida pública. Nada havia de mais duro do que a vida dos religiosos. A pobreza de uma ordem recém fundada fazia-se sentir por toda a qualidade de privações. O seu corpo e o seu espírito, cansados do trabalho da propagação evangélica, não renovavam as suas forças senão com os jejuns e a abstinência; uma curta noite passada sobre um duro leito sucedia às longas horas do dia. As menores faltas contra a regra eram punidas severamente. Um irmão converso tendo sem licença aceitado não sei que tecido ordinário, Reinaldo mandou-lhe destapar os ombros para, conforme o costume, ser- lhe aplicada a disciplina na presença de todos os religiosos. Recusou-se o culpado a obedecer. Reinaldo fê-lo despir pelos religiosos e levantando os olhos ao céu entre lágrimas, disse:

“Meu Senhor Jesus Cristo,
que destes ao vosso servo Bento
o poder de expulsar o demônio
do corpo dos seus monges
por meio da disciplina,
concedei-me a graça de vencer a tentação
deste pobre irmão pelo mesmo meio”.

Gérard de Frachet
Vida dos Frades, L. IV, c. 2

Aplicou-lhe a disciplina em seguida com tal força, que os Religiosos, presentes sentiram se comovidos a ponto de chorar.

Compreende-se que a natureza estivesse vencida em homens capazes de se sujeitar a semelhantes tratamentos. E esta vitória alcançada sobre eles mesmos pela cruel repressão do orgulho e dos sentidos voltavam-na eles logo gloriosamente contra o mundo. Porque que império poderia no futuro ter o mundo sobre corações assim fortalecidos contra a vergonha e a dor ? Fato admirável! A religião serve-se para exaltar o homem dos mesmos meios de que o mundo se serve para os rebaixar. Restitui-lhe a liberdade pela prática da servidão; fá-lo rei crucificando-o. Portanto, não eram as penitências do claustro a mais dura prova a que se sujeitavam os jovens ou ilustres noviços que se apresentavam às portas de Saint Nicolas de Bolonha. A principal tentação das obras no seu princípio está na sua própria novidade, nesse confuso horizonte onde flutuam todas as coisas que ainda não têm um passado. Quando qualquer estabelecimento tem atrás de si séculos, rescendem as suas pedras um perfume de estabilidade que tranqüiliza o homem no meio das duvidas que surgem no seu coração. Nele descansa como uma criança no colo de seu velho avô; nele é embalado como o marinheiro numa nau, que já atravessasse centos de vezes o Oceano. Mas nas obras novas existe urna triste harmonia com o lado fraco do coração humano: agitam-se mutuamente. Não esteve Saint- Nicolas de Bolonha ao abrigo dessas surdas tempestades, que por uma lei da Providencia experimentam e purificam todos os trabalhos divinos em que o homem coopera.

“Nos tempos”,

diz um historiador,

“em que a Ordem dos Pregadores
era ainda semelhante a um pequenino rebanho
e a uma plantação nova,
levantou-se entre os religiosos
no convento de Bolonha uma tal tentação de desalento,
que muitos chegaram a consultar entre si
sobre que outra ordem haviam de escolher,
persuadidos de que a deles,
tão recente e tão fraca,
não poderia durar muito tempo.
Dois dos religiosos mais importantes
haviam até já alcançado de um legado apostólico
licença de entrar para a ordem dos Cistercienses,
e tinham já apresentado
as competentes cartas a frei Reinaldo,
outrora deão de Saint Aignan de Orléans,
e agora vigário do bem-aventurado Domingos.
Tendo Frei Reinaldo reunido o capítulo
e expondo cheio de aflição o caso,
os religiosos prorromperam em soluços,
e uma indizível tristeza se apoderou
dos seus espíritos.
Frei Reinaldo, mudo e com os olhos fitos no céu,
só se dirigia a Deus,
em quem punha toda a sua confiança.
Frei Claro, o Toscano,
levantou-se para exortar os outros religiosos.
Era um homem bom e de grande autoridade,
que noutros tempos ensinara as artes e o direito canônico,
e depois fora prior da província romana,
penitenciário e capelão do Papa.
Acabara ele apenas o seu discurso,
quando vêem entrar mestre Rolando de Cremona,
sapientíssimo e célebre doutor,
que ensinava filosofia em Bolonha
e que foi o primeiro dos religiosos
que mais tarde ensinou Teologia em Paris.
Vinha só, inebriado e arrebatado do Espírito de Deus,
e sem dizer mais nada,
pede unicamente que lhe dêem o santo hábito.
Frei Reinaldo, fora de si,
tira o seu próprio escapulário e põe-lho ao pescoço.
O sacristão toca os sinos;
os Frades entoam o Veni Creator Spiritus,
e enquanto o cantam com vozes sufocadas
pela abundância de suas lágrimas e do seu júbilo,
acode o povo.
Uma multidão de homens,
mulheres e estudantes enchem a igreja;
a noticia do que se passa agita a cidade inteira.
Renasce a devoção pela Ordem,
desaparecem as tentações,
e os dois frades que tinham resolvido abandonar a ordem,
precipitando-se no meio do capítulo,
renunciam à licença apostólica
que tinham alcançado
e prometem perseverar até à morte”.

Gérard de Frachet
Vida dos Frades, L. I, c. 5

Tais foram os princípios de Saint-Nicolas de Bolonha e de Saint-Jacques de Paris, as duas pedras angulares do edifício dominicano. Aí, no foco das mais ilustradas universidades da Europa, se formou a flor dos pregadores e dos doutores; aí se reuniram alternadamente todos os anos, conforme o primitivo texto das constituições, os delegados de todas as províncias da ordem; aí viveram durante séculos homens, que nenhum contemporâneo excedeu, perpetuando entre os povos o respeito pela instituição que os criara. Saint-Nicolas de Bolonha teve a glória de possuir os últimos anos de Domingos e de ser o seu túmulo. Saint Jacques de Paris veio também por outro lado a ser uma sepultura célebre. Dedicando-lhe o rei S. Luiz um terno afeto, acolheu sob os seus mármores as entranhas e o coração de uma infinidade de príncipes de sangue francês. Roberto, sexto filho do santo rei e tronco da casa de Bourbon, aí foi levado à pia baptismal pelo bem- aventurado Humberto, quinto mestre geral da ordem, e aí foi sepultado. A ele se foram reunir seu filho, seu neto e seu bisneto, e os restos dos três juntos formam um só túmulo, sobre o qual está gravado este epitáfio:

“Aqui jaz a estirpe dos Bourbons;
aqui jaz o primeiro príncipe do seu nome;
este sepulcro é o berço dos reis”.

Singular destino do convento de Saint-Jacques, onde foi batizada a casa de Bourbon na pessoa do seu fundador, e onde repousam as suas quatro primeiras gerações, foi o ponto de onde partiram os golpes que a destronaram. Não era precisamente no convento de Saint-Jacques que se reunia o clube dos Jacobinos, mas em outro convento dominicano que ficava pouco mais ou menos ao meio da rua Saint-Honoré. Os mais implacáveis destruidores da monarquia reuniram-se nos seus claustros abandonados e o nome, antes usado pelos dominicanos francezes, nunca mais saiu da boca. das nações senão manchado de sangue. Hoje Saint Jacques nem mesmo é uma ruína; um grupo de casas e de casebres cobre os seus restos com a sua ignóbil sombra e, à perfeita indiferença com que este lugar tem sido tratado, é provável que a própria casa de Bourbon não saiba. que ali existiu o túmulo dos seus primeiros antepassados.