A PERFEIÇÃO EVANGÉLICA NÃO É ASSUNTO SÓ DO MONGE

14.

- É que não é a mesma coisa - objetas - pecar um leigo, ou pecar um homem que consagrou a vida a Deus. Um não cai da mesma altura que o outro e, por isso, tampouco recebem as mesmas feridas.

- Pois muito te enganas e erras - respondo-te - se pensas que uma coisa se exige do leigo e outra do monge. A diferença está em que o leigo se casa e o monge não; nas demais coisas, a um e a outro serão pedidas as mesmas contas. E assim, o que se irrita contra seu irmão sem motivo, seja leigo, seja monge, ofende igualmente a Deus; e o que olha para uma mulher para cobiçá-la, professe o estado que professe, será igualmente castigado por este adultério. E se devemos olhar com a razão, o leigo é neste caso menos credor do perdão, pois não é a mesma coisa que se deixe arrebatar pela beleza de uma mulher aquele que tem a sua própria mulher e goza de tão grande consolo, que sofrer tal percalço aquele que está privado de toda ajuda semelhante. Do mesmo, o que jura, seja leigo ou monge, é condenado. Porque quando Cristo nos ensinou o mandamento e a lei sobre isto, não fez distinção semelhante dizendo:

"Se o que jura é um monge, o juramento procede do maligno, e se não é um monge, não";

mas disse simplesmente e de uma só vez para todo o mundo:

"Eu porém, vos digo: Não jureis de modo algum".
Mt 5,34

E pelo mesmo motivo, quando disse:

"Ai dos que riem!",
Lc 6,25

não acrescentou:

"Se são monges",

mas apresentou a lei simplesmente para todos. E o mesmo fez em todos os outros grandes e maravilhosos mandamentos que nos ensinou. E assim quando diz:

"Bem-aventurados os pobres de espíritos, os que choram, os mansos, os que têm fome e sede da justiça, os misericordiosos, os puros de coração, os pacíficos, os que sofrem perseguição por amor da justiça, os que por sua causa ouvem todo o mal por parte dos gentios",
Mt 5, 3-12

não aparece em nenhum lugar o nome do monge nem do leigo. Esta distinção foi introduzida por invenção dos homens.