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Para que, portanto, comecemos pela primeira, não comparamos, neste
lugar, a Monarquia com as formas de regimes mistos nem a antepomos a
todos os regimes mistos e simples, mas aqui somente declaramos que, se
alguma forma simples de regime necessariamente deve ser escolhida, sem
dúvida essa forma é a Monarquia. Isto, porém, comprovamos por
dois argumentos.
Primeiro: Convêm nesta sentença todos os velhos escritores
hebreus, gregos, latinos, teólogos, filósofos, oradores,
historiadores e poetas. Filão, no livro sobre a confusão das
línguas, louvando a sentença de Homero, diz: "Aquilo de muitos
imperarem é mau, seja o rei único para as cidades, que não pertence
mais aos homens do que ao mundo e a Deus".
Da parte dos gregos, o bem aventurado Justino, na oração de
exortação aos gentios, ensina ser nocivo o principado de muitos e,
ao contrário, o principado de um só ser útil e salutar. De fato,
o principado de um só está livre de guerras e disputas, e costuma ser
livre. Também o beato Atanásio, na oração contra os ídolos,
diz: "De fato, como a multidão de deuses dissemos ser a nulidade
dos deuses, assim também é necessário que, na multidão dos
príncipes, nenhum deles pareça ser príncipe; onde, porém, não
há príncipe, ali nasce o distúrbio".
Entre os latinos, também nos ensina o bem aventurado Cipriano, que
prova, no tratado da Vaidade dos Ídolos, ser fortíssimo que Deus
é um só a partir do fato de que a monarquia é o melhor de todos os
governos, é um regime ótimo e o mais natural. Diz: "Para o
império divino, tomemos também emprestado o exemplo dos terrenos:
como a sociedade do reino ou começou com a fé ou nunca cessou sem
derramamento de sangue?". E o bem aventurado Jerônimo, na
Epístola ao monge Rústico: "Um só imperador é juiz de uma só
província. Roma, como foi fundada não pôde ter simultaneamente
dois irmãos reis". Finalmente, S Tomás, na primeira parte da
Summa Teológica, q. 103, art. 3, e no livro 4 de Contra os
Gentios, cap 76.
Já dos filósofos, Platão, na República, depois da metade,
diz: "Um só domínio para os bons, instruído pelas leis, e de
todas elas a melhor lei é; aquele governo, no qual verdadeiramente
não muitos imperam, devemos considerar como mediano; dos muitos
restantes, (devemos considerar) a administração das coisas por
todos débil ou enferma". Platão foi seguido por Aristóteles no
livro 8 da Ética, capítulo 3. Depois que enumerou aquelas três
formas de regime, acrescentou estas palavras: "Destas a melhor de
todas é o reino, a pior de todas a República".
Sêneca, no livro 2 de Benef., diz: "Marcus Brutus não agiu de
um modo suficientemente prudente ao matar Julio César com a
esperança da liberdade." E, dando a razão, diz: "Já que o
Estado mais excelente da cidade é estar sob um só rei justo".
Plutarco, porém, escreveu todo um opúsculo sobre a Monarquia e as
outras formas de reger a multidão, no qual expressou a sua sentença.
"Se a opção", diz, "de escolher tiver sido concedida, não
escolha outra coisa senão a do poder um só". E novamente o mesmo
Plutarco, em Sólon, dizendo terem-se originado em Atenas muitas
sedições quando vigorava a Democracia, acrescenta, em seguida:
"Há uma razão que parecia ser válida para a salvaguarda, a
quietude e a ordem : se as coisas fossem entregues para serem
dominadas".
Por parte dos oradores, Isócrates, naquele discurso que leva o nome
de Nicocles, por muitas razões se esforça para provar isto mesmo.
Porém, João Sobeus, no sermão 45 com este título, observou
que "a Monarquia é mais bela". E nesse discurso produziu os
testemunhos de Hesíodo, Eurípedes, Sirino, Ecfantes e de muitos
outros para confirmar isto mesmo.
Heródoto, no livro 3 das suas Histórias que se chama Tália,
tendo exposto a matança dos Magos, que ocuparam o reino da Pérsia,
expõe também a disputa que entre os príncipes foi versada sobre a
república que seria constituída. Disputa cujo resultado foi este:
que diligentemente examinadas as sentenças daqueles que disputavam a
favor da Aristocracia ou a favor da República (Democracia), com o
consenso de todos exceto de um só, julgaram que a Monarquia seria a
mais útil e a melhor. E por causa disso também a conservaram na
Pérsia.
Finalmente, da parte dos poetas, Homero, no livro 2 da Ilíada,
expõe aquela sentença celebrada por todos os escritores.
"Não é bom o governo de muitos. Haja um só rei". A este
testemunho de Homero, contrário ao qual, somente, entre tantos
outros, fez objeção a sua sentença, responde Calvino, no livro 4
das Institutas, capítulo 6, parágrafo 8: "Fácil é, diz, a
resposta: de fato, não neste sentido ou do Ulisses de Homero, ou
de outros louva-se a Monarquia, como se uma só pessoa devesse reger toda a
face do império; mas quiseram indicar que, no reino, dois não cabem
e que o poder (como disse ele) é impaciente (no sentido de que não
sofre a ação) do consorte".
E certamente, se foi fácil responder a Calvino, mais fácil para
nós é refutar a sua resposta, porque ou nada disse, ou disse o que
nós dissemos, ou disse o falso e, assim, se contradisse. Se, de
fato, ao dizer "um só reino não comporta dois", a força enfatiza
a palavra "reino" e quer dizer que o reino propriamente dito não
comporta dois, já que o reino propriamente dito é a suma potestade de
um só homem. Ou, então, não diz absolutamente nada, mas somente
mostra a ambigüidade das palavras obscuras aos imperitos. Porque
dizer nesse sentido "o reino não comporta dois" significa o mesmo que
alguém dissesse "o regime de um só não é regime de dois", e "um
só homem não são dois homens"; para um tal pronunciamento, em obra
nenhuma consistia a sabedoria de Ulisses.
Se, porém, a ênfase não faz a força na palavra, mas o reino
intelige a multidão que deve ser regida, então ele mesmo diz o que
nós dizemos. Por isso, de fato afirmamos que a Monarquia antecede a
República (Democracia) e a Aristocracia, porque a multidão não
é regida comodamente por muitos, e o poder é impaciente do consorte.
Se, finalmente, ele quis que fosse entendido por reino não qualquer
multidão, ou alguma única província, ou algum reino pequeno, de
tal maneira que o sentido seja "a uma província deve-se atribuir um
só rei", não sendo todavia o mesmo o julgamento de toda a face da
terra, então ele diz o falso e contradiz a si mesmo, porque o livro
de Homero não discute se a república se constitui em uma só
província, mas ele prega para todo o exército dos Gregos que lutava
em Tróia, exército no qual havia muitas nações, muitos príncipes
e também alguns reis, e afirma não ser conveniente que toda esta
multidão seja regida por muitos, mas apenas por um só. E assim, o
sentido dessa celebérrima sentença não pode ser outro senão que em
qualquer uma só multidão dever haver um só reitor primário: o que,
de fato, tem um lugar idêntico no reino pequeno e nos impérios
máximos. Com efeito, não se deve a um só reino exíguo um só rei
porque aquele reino é exíguo, mas porque ele é um só.
Pelo que se algum reino amplíssimo, tal como foi o de Nino, Ciro,
ou também Alexandre ou Augusto, for um só, dever-se-á a ele um
só príncipe, e já que a Igreja é uma só, como diz
Lucas I: "o seu reino não terá fim" , e Daniel, cap 2: "nos
dias daqueles reinos suscitará Deus o reino dos céus que não deverá
ser dissipado eternamente": por causa disso deverá ser governado por
um só.
Ademais também luta consigo mesmo Calvino. Posto que não somente
em toda a face da terra considera não ser útil a Monarquia, como
também em uma só cidade ou igreja, como abertamente se entende no
livro 4 das Institutas, capítulo 41 parte 6, onde todo poder
eclesiástico atribui à Assembléia dos Anciãos. E no livro 4,
cap 20, parágrafo 8, onde louva aquelas cidades em que derrubaram
os príncipes e são governadas pelo povo
e pelo senado, como é a República de Genebra, na Suíça, onde
ele governava. Portanto, não deixando Calvino totalmente nenhum
lugar à Monarquia, parecerá que ele tenha respondido bem a tantos e
tão graves autores que louvam a sentença de Homero.
Outra razão é trazida pela autoridade divina, que mostra, de três
modos, que a Monarquia é o governo mais excelente. Primeiro, pela
instituição do gênero humano: Deus, de fato, fez o gênero humano
a partir de um só, como diz o Apóstolo, no capítulo 17 de
Atos: que, com efeito, não produziu o homem e a mulher a partir do
barro, mas o homem a partir do barro, e a mulher a partir do homem.
Expondo a causa disso, S João Crisóstomo, na homilia 34,
sobre a epístola I Cor., capítulo 13, diz ser esta: para que
houvesse entre os homens não a Democracia, mas o reino. De fato,
se muitos homens tivessem sido produzidos a partir do barro, todos eles
deveriam ter sido príncipes de modo igual em sua posteridade. Acerca
do qual poderíamos duvidar merecidamente se a Deus agradaria o regime
de um só. Agora, porém, tendo feito todo o gênero dos homens a
partir de um só, que todos dependessem de um só, parece ter dito
suficientemente que aprova mais o principado de um só do que o governo
de muitos.
Então, indicou Deus a sua sentença quando não apenas nos homens,
mas também praticamente em todas as coisas enxertou uma inclinação
natural para o regime monárquico. Nem pode haver dúvida de que a
propensão natural deve ser atribuída a Deus, autor da natureza.
Declara, em primeiro lugar, ser o principado de um só maximamente
natural, como em qualquer casa naturalmente pertence a um só pai de
família o governo do cônjuge, dos filhos, dos servos e,
finalmente, das demais coisas. Assim como a maior parte da face da
terra é governada pelos reis. E, ademais, que os reinos são de
longe mais antigos do que as repúblicas. No princípio das coisas, o
império dos povos e das nações estava inteiramente em poder dos
reis.
Finalmente, também pela natureza, os seres vivos carentes de razão
parecem pedir o principado de um só. Assim, de fato, fala S
Cipriano, no Tratado sobre a Vaidade dos Ídolos: "Um só rei
para as abelhas, um só condutor para a grei e um só reino para as
manadas". Acrescenta S Jerônimo, na Epístola a Rústico, que
as aves seguem um só por uma ordem sábia. Calvino ri dessa razão no
livro 4 das Institutas, cap. 6, par. 8. Ele diz: "Se Deus
aprecia esta coisa, eles tomam a prova a partir das aves e das abelhas
que a si sempre escolhem um só guia e não muitos. De boa vontade
recebo o que os exemplos dizem, mas por acaso as aves se reúnem de
toda face da terra para escolher um só rei? Nas suas colméias, elas
se contentam com reis únicos e também assim ocorre com as aves. Cada
bando possui seu rei próprio; o que mais se pode provar além do fato
de que cada uma das igrejas deve escolher os seus próprios bispos?"
Mas facilmente pode-se refutar esta resposta de Calvino. Porque a
Igreja é um só redil, diz João, capítulo 10, e não muitos
redis. E também pode ser dita uma só colméia e um só rebanho.
E, por isso, assim como há um só rei para as abelhas e as aves
seguem um só guia por uma ordem sábia, assim deve toda Igreja ter um
só e seguir um só condutor e doutor primário. Ademais, as aves e
as abelhas não são de uma natureza tal que se possam unir por uma
conjunção e copular com os animais ausentes e colocados ao longe e,
por causa disso, não é de se admirar que elas não se reúnam de toda
terra para escolherem um só rei; e pelo fato de que o rebanho de
qualquer uma delas tem seu próprio rei, fica claro que o regime
natural é o regime de um só.
Finalmente, se por estes exemplos levantados pelos mais sérios padres
deduzimos, como diz Calvino, que cada igreja deve escolher os seus
próprios bispos, por que o próprio bispo não recebe, nem que seja
apenas pelo nome, o poder eclesiástico que, na realidade, ele
atribui à Assembléia dos Anciãos?
Omitidas, porém, todas essas coisas, a forma de reino que Deus
quis confirmar pela sua santidade pode-se entender também maximamente
por isto, pela república que ele instituiu no povo dos Hebreus. De
fato, como diz Calvino, o governo dos Hebreus não foi próximo à
Aristocracia ou à Democracia, mas foi plenamente monárquico. Os
príncipes dos primeiros Hebreus foram patriarcas, como Abraão,
Jacó, Judas e os demais; depois condutores, como Moisés e
Josué; depois juízes, como Samuel, Sansão e outros; depois
reis, como Saul, Davi e Salomão. E, finalmente, condutores,
como Zorobabel e os Macabeus.
Que os patriarcas tivessem sido revestidos de poder real indicam as
coisas realizadas. Abrahão, no Gênesis, 14, conduziu a guerra
contra quatro reis e não se lê ter recebido de nenhum senado o poder
dos ótimos e nem ter ele consultado algum senado. Judas, no Gen.
38, tendo sido sua nora acusada de adultério, julgou pelo fogo e
não consultou ou pediu a nenhum senado. Moisés, no Êxodo, 32,
como verdadeiro e sumo príncipe do povo dos Judeus, por causa do
bezerro de ouro que tinham erigido, em um só dia mandou matar muitos
milhares de Judeus e não lemos que alguma consulta senatorial ou
plebiscito tenha precedido essa decisão. A mesma coisa pode ser dita
completamente dos juizes que, por nenhuma faculdade admitida pelo
senado ou pelo povo, administravam guerras e davam a morte àqueles a
quem queriam. Certamente Gedeão, no capítulo 8 dos Juizes,
depois das vitórias dos Madianitas, matou 70 homens na cidade de
Socó e derrubou a torre de Fanuel.
Ademais, que os reis e aqueles que os seguiram, os condutores dos
Judeus, foram revestidos de suma e, portanto, da régia potestade é algo mais
evidente do que seja necessário provar. Teria parecido, portanto, a
Calvino, onde tiver lido, que a república dos Judeus
costumeiramente teria sido governada pelos melhores e pelo povo, e não
por um só príncipe.
Mas, talvez, objetar-se-á aquilo que temos no livro 1 dos Reis,
capítulo 8, onde os israelitas são repreendidos por Deus por terem
pedido um rei. Porque, se a Deus não aprouve instituir um rei para
governar aquela república, como se pode crer que os condutores e os
juízes tinham uma potestade régia constituída por Deus?
Respondemos: por dois modos alguém pode, com sumo poder, governar
toda república: de um modo, como rei e senhor, que não depende de
ninguém; de outro modo, como vice-rei ou condutor primário, que
certamente está acima de todo povo, mas que, todavia, tenha que se
submeter ao seu rei.
De fato, Deus já tinha instituído isto na república dos Judeus
posteriormente, no tempo dos condutores e dos juízes, de tal maneira
que fosse ele mesmo como que o verdadeiro e peculiar rei daquele povo;
e, todavia, já que eles eram homens e necessitavam de um reitor
visível a quem poderiam ir e consultar, colocou para eles um homem
como um vice-rei que de nenhum modo fosse sujeito ao povo, mas somente
ao verdadeiro Deus e rei. Isto é o que está escrito em
Samuel 1, cap. 8: "Não se afastaram de ti, mas de
mim, para que eu não reine sobre eles". E também é isso que ele
diz ao Apóstolo no cap. 3 da Epístola aos Hebreus: "Moisés era
fiel em toda sua casa como um servo".
Porém, porque os judeus, não contentes com este estado da
república, quiseram ter aquele primeiro modo de rei, que não
governasse todos ao modo de um só e que também fizesse condutores e
juízes, mas que possuísse todo reino como seu e próprio, e aos
filhos e aos netos como herança transmitissem, por causa disso
merecidamente foram repreendidos e castigados pelo Senhor. Não,
todavia, desgostou a Deus aquela cobiça do povo de ter o próprio
rei, de tal maneira que os mandou aplicar a sua alma, em vez disso,
em aderir à Democracia, ou aplicar o ânimo à Aristocracia;
antes, ao contrário, ele mesmo, Deus, designou para eles um rei
excelente e, depois, tanto o rei, como o reino deles, conservou e
protegeu enquanto permaneceram no ofício.
Segue-se a última razão, que é tirada da lista de suas
propriedades, as quais todos têm como reconhecido convir ao ótimo
regime. E a primeira propriedade é a ordem, posto que o melhor
governo é aquele que é mais ordenado; e que a Monarquia é mais
ordenada que a Democracia e a Aristocracia pode ser demonstrado
assim. Toda ordem está colocada nisto, que alguns presidam e outros
se submetam; e não também entre iguais, mas entre superiores e
inferiores. Onde, porém, existe uma Monarquia, ali todos
inteiramente possuem alguma ordem, não havendo ninguém que não seja
submetido a alguém, excetuado apenas aquele que administre o cuidado
de todos. Por esta razão, na Igreja Católica, existe uma suma
ordem, pela qual o povo está submetido aos párocos, os párocos aos
bispos, os bispos aos metropolitanos, os metropolitanos aos primazes,
os primazes ao sumo pontífice, e o sumo pontífice a Deus. Onde,
porém, o governo é inteiramente dos melhores ou Aristocracia, o
povo, de fato, tem a sua ordem, estando submetido aos aristocratas;
mas os aristocratas entre si não tem nenhuma ordem. Muito mais,
também, a Democracia carece de ordem, já que todos os cidadãos
são considerados na república de mesma condição e autoridade.
A outra propriedade é a consecução do fim próprio. De fato, não
pode haver dúvida de que a melhor forma de reger a multidão seja
aquela que mais comodamente e mais facilmente alcança o fim proposto;
o fim, porém, do governo é a união dos cidadãos entre si e a paz.
União esta que parece estar colocada de uma maneira poderosíssima no
fato de que todos sintam o mesmo, queiram o mesmo e sigam o mesmo.
Isto muito mais certamente e muito mais facilmente obterão se tiverem
que se submeter a um só do que a muitos; dificilmente, de fato,
pode-se conseguir que muitos, dos quais um não depende do outro,
julguem as coisas do mesmo modo. Assim, também, se forem muitos os
que regem a multidão e um não impere sobre o outro, ou alguém não
obedecerá a alguém, ou será necessário dividir o povo em várias
ocupações; e, então, não poderá acontecer que ao ofício de um só pertença o imperar.
Confirma isso, também, o uso e a experiência que é mestra das
coisas. Posto que, junto aos Romanos, quando estavam debaixo dos
reis, lê-se que muito raras eram as distinções entre os cidadãos.
Removidos, porém, os reis, sendo a república administrada por
magistrados anuais, raro foi aquele ano em que não contendessem os
patrícios com os plebeus. E, finalmente, as disputas entre os civis
progrediram até um certo ponto em que, de uma certa forma sob as suas
mãos, morreu aquela poderosíssima república. Chegou, finalmente,
aquele sob o qual a cidade romana nunca experimentou maior e mais longa
paz. Isto se deu sob o império de Augusto, que instituiu a primeira
monarquia estável de Roma.
A terceira propriedade é a força e a potência da república.
Supera, pelo julgamento de todos, aos demais aquele governo que faz
uma república mais potente e mais forte. É mais forte, porém,
aquela república na qual maior é a união e a conspiração dos
cidadãos entre si. As forças, de fato, unidas em si são mais
fortes do que as forças dissipadas, e a maior união está mais onde
todos dependem de um só do que onde dependem de muitos, como acima foi
demonstrado. Portanto, a Monarquia faz uma república mais forte, e
ela própria é a mais excelente forma de governo.
Acrescenta-se a experiência de que, dos quatro mais poderosos
impérios, três cresceram debaixo de reis: o império dos
Assírios, o dos Persas e o dos Gregos. Um outro é o dos
Romanos, que cresceu sob o domínio do povo, mas também ele não
pôde conservar-se, nas máximas perturbações, sem um ditador,
isto é, sem um rei constituído durante algum tempo. E floresceu
muito mais, depois, sob a Monarquia de Augusto do que jamais havia
florescido no tempo da República.
A quarta propriedade é a estabilidade e a longevidade. De fato,
não se pode negar que o melhor governo é aquele que é mais estável e
mais longevo, e a Monarquia, de fato, é muito mais duradoura do que
a Aristocracia ou a Democracia. Em se tratando da força externa,
isso já foi demonstrado quando ensinamos que, sem dúvida, ela era
mais forte.
Agora, falta demonstrar que, por não ser usada por nenhuma força
externa, menos envenenada está a Monarquia pelos acasos e pela
mutação do que nenhuma outra forma de governo. Isto, porém,se
prova assim: todo reino dividido entre si será destruído, como diz Cristo em
Mateus, 12. A Monarquia é mais difícil de ser dividida do que
nenhuma outra forma de governo. Aquilo que, de fato, se divide menos
facilmente é o que é mais uno. Ora, é mais uno aquilo que é
simplesmente uno do que uma multidão que converge para um só.
Aquela, de fato, é una per se e naturalmente, e nenhuma outra é
tão una . Esta é una somente pela arte, mas por si e naturalmente
são muitos. Portanto, a Monarquia, que depende de um só, menos
facilmente será dividida do que a Aristocracia ou a Democracia, que
dependem de uma multidão que se ajunta num só.
E aqui, admiravelmente, a Monarquia dos Assírios, desde Nilo
até Sardanapalon, durou 1240 anos, como ensina Eusébio na
Crônica, ou 1300, como se depreende do livro 1º de Justino,
ou mais de 1400, como se vê no livro 2, capítulo 7
de Deodoro. Assim, portanto, durou esse reino, de tal maneira
que, morto o rei, o sucessor do reino foi sempre o filho, se é
verdadeiramente conforme escreve Valleius Pateculus no primeiro volume
das histórias.
O reino, porém, dos Citas, que é
tido por todos como antiqüíssimo, nem pôde ser destruído por nenhum
inimigo externo, como ensina Justino no livro 2, nem por si foi
dissolvido em nenhum tempo; pelo que foi necessário aquele reino ter
permanecido de pé por alguns milhares de anos, e não houve, assim,
nenhuma república que tivesse sido longeva e estável.
Certamente poderosíssima foi a República dos Romanos. E
dificilmente conseguiu alcançar 480 anos, desde a expulsão dos
reis e a Monarquia de Julio César. E sobre a Monarquia do
oriente, de Julio até o ultimo Constantino, sem interrupção,
durou 1400 anos. No ocidente, porém, desde o próprio
Julio César até Augusto mais de 500, e desde Carlos Magno até o presente imperador foram
800 anos. Mas naqueles 480 anos, nos quais floresceu a
Democracia, nem sempre do mesmo modo a república era regida. No
início, de fato, os cônsules eram criados anualmente; depois de
algum tempo, foram acrescentados os tribunos; então, removidos os
cônsules e tribunos, foram criados os decêmviros; também eles
rejeitados depois de um ano, novamente os cônsules e os tribunos foram
introduzidos. E não raro introduziram ditadores e tribunos militares
no seu poder consular. Assim, nenhuma forma única durou longamente e
nenhum deles simultaneamente conseguiu chegar à idade dos nobres
reinos.
Alguns objetariam, talvez, a república dos Vênetos (Veneza),
que enumera em anos mais do que 1100. E nem ela chegou aos anos
dos reinos dos Citas ou dos Assírios;
ao contrário, nem ao dos Francos, de certo; e, além disso, não
é a república de Veneza uma Aristocracia misturada com a
Democracia, aquela forma que Calvino louva, mas uma Aristocracia
misturada com a Monarquia, de tal maneira que, na sua cidade, não
há lugar para a Democracia.
A quinta e última propriedade é a facilidade do governo. Muito, de
fato, importa se facilmente ou dificilmente pode-se obter que uma
sociedade seja bem governada. Mais facilmente pode-se provar que por
um só corretamente uma cidade pode ser regida do que por muitos.
Primeiro: É mais fácil um só homem encontrar o bem do que muitos,
de onde que mais facilmente os povos se ordenarão a um só do que a
muitos.
Ademais, os magistrados, que por breve tempo administram uma
república, são antes mais frequentemente obrigados a deporem a
província do que terão conhecido completamente os negócios da
republica. O rei, porém, que sempre está no mesmo ofício, ainda
que de vez em quando seja de inteligência mais lenta, todavia, pelo
uso e pela experiência está mais adiante do que muitos outros.
Ademais, os magistrados anuais consideram como alheios os negócios da
república e não como próprios. O rei, porém, considera o reino
como algo seu e próprio, e mais facilmente e também com mais
diligencia cuida das próprias coisas do que das alheias. Onde há
muitos que reinam dificilmente pode-se fazer que estejam ausentes a
emulação, a ambição e a contenda, pelo que não raramente costuma
acontecer que alguns impeçam a outros e o façam de tal maneira que
aqueles que administram em presença (em ato) a república administrem
mal. E isso pelo fato de que uma maior glória vem a eles quando
exercem a magistratura. Contudo, o monarca que não tem a quem
invejar e com quem contender sobre o governo facilmente modera todas as
coisas.
Finalmente, assim como acontece nas famílias, quando muitos servos
são designados nos mesmos ministérios, não cuidam diligentemente
desses negócios porque um deixa ao outro a província comum, assim
também, quando há muitos príncipes na república, um olha para o
outro, enquanto cada um rejeita o ônus para os colegas, ninguém
satisfatoriamente usa de cuidado diligente para com a cidade. O rei,
porém, que sabe que todas as coisas dependem apenas de si próprio
cogita nada negligenciar e até aqui, de fato, está demonstrado que a
Monarquia simples de longe está acima da simples Aristocracia.
Agora vamos nos aproximar para provar a segunda proposição.
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